CLIPPING – DIREITO PÚBLICO Ed. n° 2.268 – JUN/2021

JURISPRUDÊNCIA

STJ

Informativo
nº 0702 – Publicação: 28 de junho de 2021.

RECURSOS REPETITIVOS

Processo

REsp 1.860.018-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 23/06/2021, DJe 28/06/2021. (Tema 1064)

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO PREVIDENCIÁRIO, DIREITO FINANCEIRO

Tema

Inscrição em dívida ativa. Benefício previdenciário indevidamente recebido, qualificado como enriquecimento ilícito. Aplicabilidade dos §§3º e 4º, do art. 115, da Lei n. 8.213/1991, com redação dada pela Medida Provisória n. 780/2017 (Lei n. 494/2017) e Medida Provisória n. 871/2019 (Lei n. 13.846/2019) aos processos em curso donde constam créditos constituídos anteriormente. Impossibilidade. Tema 1064.

Destaque

(I) As inscrições em dívida ativa dos créditos referentes a benefícios previdenciários ou assistenciais pagos indevidamente ou além do devido constituídos por processos administrativos que tenham sido iniciados antes da vigência da Medida Provisória n. 780, de 2017, convertida na Lei n. 13.494/2017 (antes de 22.05.2017) são nulas, devendo a constituição desses créditos ser reiniciada através de notificações/intimações administrativas a fim de permitir-se o contraditório administrativo e a ampla defesa aos devedores e, ao final, a inscrição em dívida ativa, obedecendo-se os prazos prescricionais aplicáveis; e

(II) As inscrições em dívida ativa dos créditos referentes a benefícios previdenciários ou assistenciais pagos indevidamente ou além do devido contra os terceiros beneficiados que sabiam ou deveriam saber da origem dos benefícios pagos indevidamente em razão de fraude, dolo ou coação, constituídos por processos administrativos que tenham sido iniciados antes da vigência da Medida Provisória n. 871, de 2019, convertida na Lei n. 13.846/2019 (antes de 18.01.2019) são nulas, devendo a constituição desses créditos ser reiniciada através de notificações/intimações administrativas a fim de permitir-se o contraditório administrativo e a ampla defesa aos devedores e, ao final, a inscrição em dívida ativa, obedecendo-se os prazos prescricionais aplicáveis.

Informações do Inteiro Teor

O presente repetitivo é um desdobramento do Tema Repetitivo n. 598, onde foi submetida a julgamento no âmbito do REsp 1.350.804-PR (Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12.06.2013) a “Questão referente à possibilidade de inscrição em dívida ativa de benefício previdenciário indevidamente recebido, qualificado como enriquecimento ilícito”. Naquela ocasião foi definido que a inscrição em dívida ativa de valor decorrente de ilícito extracontratual deve ser fundamentada em dispositivo legal específico que a autorize expressamente, o que impossibilitava a inscrição em dívida ativa de valor indevidamente recebido, a título de benefício previdenciário do INSS, pois não havia lei específica que assim o dispusesse. Essa lacuna de lei tornava ilegal o art. 154, §4º, II, do Decreto n. 3.048/19999 que determinava a inscrição em dívida ativa de benefício previdenciário pago indevidamente, já que não dispunha de amparo legal.

Pode-se colher da ratio decidendi do repetitivo REsp 1.350.804-PR três requisitos prévios à inscrição em dívida ativa: 1º) a presença de lei autorizativa para a apuração administrativa (constituição); 2º) a oportunização de contraditório prévio nessa apuração; e 3º) a presença de lei autorizativa para a inscrição do débito em dívida ativa.

Após o advento da Medida Provisória n. 780/2017 (convertida na Lei n. 13.494/2017) a que se sucedeu a Medida Provisória n. 871/2019 (convertida na Lei n. 13.846/2019), que alteraram e adicionaram os §§ 3º, 4º e 5º ao art. 115, da Lei n. 8.213/1991, foi determinada a inscrição em dívida ativa pela Procuradoria-Geral Federal – PGF dos créditos constituídos pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS em decorrência de benefício previdenciário ou assistencial pago indevidamente ou além do devido, inclusive para terceiro beneficiado que sabia ou deveria saber da origem do benefício pago indevidamente em razão de fraude, dolo ou coação.

Considerando-se as razões de decidir do do repetitivo REsp 1.350.804-PR, as alterações legais não podem retroagir para alcançar créditos constituídos (lançados) antes de sua vigência, indiferente, portanto, que a inscrição em dívida ativa tenha sido feita depois da vigência das respectivas alterações legislativas. O processo administrativo que enseja a constituição do crédito (lançamento) há que ter início (notificação para defesa) e término (lançamento) dentro da vigência das leis novas para que a inscrição em dívida ativa seja válida.



Processo

REsp 1.794.854-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 23/06/2021. (Tema 1077)

Ramo do Direito

DIREITO PENAL

Tema

Dosimetria da pena. Artigo 59 do Código Penal. Condenações pretéritas com trânsito em julgado. Valoração negativa da personalidade e conduta social. Impossibilidade. Tema 1077.

Destaque

Condenações criminais transitadas em julgado, não consideradas para caracterizar a reincidência, somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a título de antecedentes criminais, não se admitindo sua utilização para desabonar a personalidade ou a conduta social do agente.

Informações do Inteiro Teor

No que concerne à fixação da pena-base, é certo que o Julgador deve, ao individualizar a pena, examinar com acuidade os elementos que dizem respeito ao fato delituoso e aspectos inerentes ao agente, obedecidos e sopesados todos os critérios legais para aplicar, de forma justa e fundamentada, a reprimenda que seja, proporcionalmente, necessária e suficiente para reprovação do crime, sobrepujando as elementares comuns do próprio tipo legal.

No art. 59 do Código Penal, com redação conferida pela Lei n. 7.209/1984, o legislador elencou oito circunstâncias judiciais para individualização da pena na primeira fase da dosimetria, quais sejam: a culpabilidade; os antecedentes; a conduta social; a personalidade do agente; os motivos; as circunstâncias; as consequências do crime; e o comportamento da vítima.

Ao considerar desfavoráveis as circunstâncias judiciais, deve o Julgador declinar, motivadamente, as suas razões, que devem corresponder objetivamente às características próprias do vetor desabonado. A inobservância dessa regra implica ofensa ao preceito contido no art. 93, inciso IX, da Constituição da República.

No caso, analisa-se a possibilidade de condenações criminais transitadas em julgado serem valoradas para desabonar os vetores personalidade e conduta social.

A doutrina diferencia detalhadamente antecedentes criminais de conduta social e esclarece que o legislador penal determinou essa análise em momentos distintos porque “os antecedentes traduzem o passado criminal do agente, a conduta social deve buscar aferir o seu comportamento perante a sociedade, afastando tudo aquilo que diga respeito à prática de infrações penais”. Especifica, ainda, que as incriminações anteriores “jamais servirão de base para a conduta social, pois abrange todo o comportamento do agente no seio da sociedade, afastando-se desse seu raciocínio seu histórico criminal, verificável em sede de antecedentes penais”.

Quanto ao vetor personalidade do agente, a mensuração negativa da referida moduladora “‘deve ser aferida a partir de uma análise pormenorizada, com base em elementos concretos extraídos dos autos, acerca da insensibilidade, desonestidade e modo de agir do criminoso para a consumação do delito […]’ (HC 472.654/DF, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 11/3/2019)” (STJ, AgRg no REsp 1.918.046/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 19/04/2021).

“A jurisprudência da Suprema Corte (e a do Superior Tribunal de Justiça) orienta-se no sentido de repelir a possibilidade jurídica de o magistrado sentenciante valorar negativamente, na primeira fase da operação de dosimetria penal, as circunstâncias judiciais da personalidade e da conduta social, quando se utiliza, para esse efeito, de condenações criminais anteriores, ainda que transitadas em julgado, pois esse específico aspecto (prévias condenações penais) há de caracterizar, unicamente, maus antecedentes” (STF, RHC 144.337-AgR, Rel. Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 22/11/2019).

Em conclusão, o vetor dos antecedentes é o que se refere única e exclusivamente ao histórico criminal do agente. “O conceito de maus antecedentes, por ser mais amplo do que o da reincidência, abrange as condenações definitivas, por fato anterior ao delito, transitadas em julgado no curso da ação penal e as atingidas pelo período depurador, ressalvada casuística constatação de grande período de tempo ou pequena gravidade do fato prévio” (STJ, AgRg no AREsp 924.174/DF, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 16/12/2016).


Processo

REsp 1.761.874-SC, Rel. Min. Assusete Magalhães, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/06/2021. (Tema 1005)

Ramo do Direito

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

Tema

Benefício previdenciário. Revisão. Tetos das Emendas Constitucionais 20/98 e 41/2003. Valores reconhecidos judicialmente, em ação de conhecimento individual, cujo pedido coincide com aquele anteriormente formulado em ação civil pública. Interrupção da prescrição quinquenal. Data do ajuizamento da ação individual. Tema 1005.

Destaque

Na ação de conhecimento individual, proposta com o objetivo de adequar a renda mensal do benefício previdenciário aos tetos fixados pelas Emendas Constitucionais 20/98 e 41/2003 e cujo pedido coincide com aquele anteriormente formulado em ação civil pública, a interrupção da prescrição quinquenal, para recebimento das parcelas vencidas, é a data de ajuizamento da lide individual, salvo se requerida a sua suspensão, na forma do art. 104 da Lei n. 8.078/1990.

Informações do Inteiro Teor

Consoante pacífica e atual jurisprudência do STJ, interrompe-se a prescrição quinquenal para o recebimento de parcelas vencidas – reconhecidas em ação de conhecimento individual, ajuizada para adequação da renda mensal do benefício aos tetos das Emendas Constitucionais 20/98 e 41/2003 – na data do ajuizamento da lide individual, ainda que precedida de anterior Ação Civil Pública com pedido coincidente, salvo se o autor da demanda individual requerer sua suspensão, no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência, nos autos, do ajuizamento da ação coletiva, na forma prevista no art. 104 da Lei n. 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor).

No tocante ao processo coletivo, o ordenamento jurídico pátrio – arts. 103 e 104 da Lei n. 8.078/1990, aplicáveis à ação civil pública (art. 21 da Lei n. 7.347/1985) – induz o titular do direito individual a permanecer inerte, até o desfecho da demanda coletiva, quando avaliará a necessidade de ajuizamento da ação individual – para a qual a propositura da ação coletiva, na forma dos arts. 219, e § 1º, do CPC/1973 e 240, e § 1º, do CPC/2015, interrompe a prescrição -, ou, em sendo o caso, promoverá o ajuizamento de execução individual do título coletivo.

Assim, a existência de ação coletiva não impede o ajuizamento de ação individual, por aquela não induzir litispendência, mas interrompe ela o prazo prescricional para a propositura da demanda individual. Entretanto, ajuizada ação individual com o mesmo pedido da ação coletiva, o autor da demanda individual não será beneficiado pelos efeitos da coisa julgada da lide coletiva, se não for requerida sua suspensão, como previsto no art. 104 da Lei n. 8.078/1990.

Segundo a jurisprudência do STJ, “o ajuizamento de ação coletiva somente tem o condão de interromper a prescrição para o recebimento de valores ou parcelas em atraso de benefícios cujos titulares optaram pela execução individual da sentença coletiva (art. 103, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor) ou daqueles que, tendo ajuizado ação individual autônoma, requereram a suspensão na forma do art. 104 do mesmo diploma legal. No caso em tela, o ajuizamento da Ação Civil Pública n. 0004911-28.2011.4.03.6183 não implica a interrupção da prescrição para o Autor, porquanto este optou por ajuizar ‘Ação de revisão de benefício previdenciário com aplicação das Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003’, e não pela execução individual da sentença coletiva” (STJ, AgInt no REsp 1.747.895/RS, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 16/11/2018).

Dessa forma, a interrupção da prescrição para o pagamento das parcelas vencidas deve recair na data da propositura da presente ação individual, garantindo-se, ao segurado, o recebimento das diferenças relativas aos cinco anos anteriores ao seu ajuizamento, nos termos do que dispõe o parágrafo único do art. 103 da Lei n. 8.213/1991.

Cumpre destacar que o STJ, no julgamento do REsp 1.388.000/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou orientação no sentido de que o prazo prescricional, para a execução individual é contado do trânsito em julgado da sentença coletiva (STJ, REsp 1.388.000/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, DJe de 12/04/2016).

Entretanto, essa não é a hipótese. A parte autora, ao invés de aguardar o desfecho da referida Ação Civil Pública, optou pelo ajuizamento de lide individual com o mesmo objeto.


Processo

REsp 1.856.967-ES, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/06/2021, DJe 28/06/2021. (Tema 1057)

Ramo do Direito

DIREITO PREVIDENCIÁRIO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Regime geral de previdência social – RGPS. Art. 112 da Lei n. 8.213/1991. Âmbito de aplicação. Ação revisional de aposentadoria de segurado falecido e de pensão por morte. Ausência de iniciativa do segurado em vida. Legitimidade ativa de pensionistas e sucessores. Ordem de preferência. Diferenças devidas e não pagas. Tema 1057.

Destaque

(I) O disposto no art. 112 da Lei n. 8.213/1991, segundo o qual “o valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento”, é aplicável aos âmbitos judicial e administrativo;

(II) Os pensionistas detêm legitimidade ativa para pleitear, por direito próprio, a revisão do benefício derivado (pensão por morte) – caso não alcançada pela decadência -, fazendo jus a diferenças pecuniárias pretéritas não prescritas, decorrentes da pensão recalculada;

(III) Caso não decaído o direito de revisar a renda mensal inicial do benefício originário do segurado instituidor, os pensionistas poderão postular a revisão da aposentadoria, a fim de auferirem eventuais parcelas não prescritas resultantes da readequação do benefício original, bem como os reflexos na graduação econômica da pensão por morte; e

(IV) À falta de dependentes legais habilitados à pensão por morte, os sucessores (herdeiros) do segurado instituidor, definidos na lei civil, são partes legítimas para pleitear, por ação e em nome próprios, a revisão do benefício original – salvo se decaído o direito ao instituidor – e, por conseguinte, de haverem eventuais diferenças pecuniárias não prescritas, oriundas do recálculo da aposentadoria do de cujus.

Informações do Inteiro Teor

A legislação processual civil desautoriza, como regra, a postulação de pretensão vinculada a direito alheio, ressalvada previsão no ordenamento jurídico.

Na seara do direito da seguridade social, a concessão e a renúncia a benefício previdenciário, é cediço, constituem direitos intuito personae, cuja disposição se atribui, unicamente, ao segurado titular.

É personalíssima, ainda, a renúncia promovida pelo beneficiário titular com o objetivo de obter benefício mais vantajoso, no Regime Geral da Previdência Social – RGPS ou em regime próprio de Previdência, segundo compreensão sedimentada em precedente dotado de eficácia vinculante (Primeira Seção, REsp 1.334.488/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 27/03/2019, DJe 29/05/2019).

Outrossim, consolidou-se, igualmente em sede de recurso especial submetido à sistemática repetitiva, a intransmissibilidade de benefícios assistenciais, uma vez que, “pela ausência de contribuição prévia, são personalíssimos e, portanto, intransferíveis aos dependentes” (Primeira Seção, REsp 1.648.305/RS, Rel. p/ acórdão Min. Regina Helena Costa, j. 22/08/2018, DJe 26/09/2018).

Isso considerado, verifica-se que o objeto da ação revisional , limitada a formular pedido de readequação de benefícios previdenciários já concedidos – no caso, aposentadoria e/ou pensão por morte -, distancia-se, largamente, de tais hipóteses impeditivas, porquanto nela não se articula pretensão vinculada a direito privativo, cujo exercício demandaria a manifestação de vontade do então titular da prestação previdenciária originária.

Noutras palavras, a revisão judicial de benefício é vocacionada a provocar apenas a implementação de ajustes nos valores da prestação previdenciária, incapaz, ipso facto, de afetar o direito primário, de índole personalíssima.

A rigor, incorporado o benefício ao patrimônio jurídico do segurado titular por regular ato de concessão, eventuais alterações dos parâmetros da outorga, indutores de reflexos financeiros, descolam-se da esfera da titularidade exclusiva do segurado, assumindo natureza puramente econômica, e, por conseguinte, passíveis de transferência a terceiros legitimados.

Daí porque, partindo-se dessa decisiva distinção ontológica, afirma-se que “os sucessores não têm legitimidade para pleitear direito personalíssimo, não exercido pelo instituidor da pensão (renúncia e concessão de outro benefício), o que difere da possibilidade de os herdeiros pleitearem diferenças pecuniárias de benefício já concedido em vida ao instituidor da pensão (art. 112 da Lei n. 8.213/1991)” (Segunda Turma, AgRg no AREsp 492.849/RS, Rel. Min. Assusete Magalhães, j. 09/06/2016, DJe 21/06/2016).

Com efeito, o art. 112 da Lei n. 8.213/1991, a par de dispensar pensionistas e sucessores de se submeterem a arrolamento ou inventário, investe-lhes de legitimidade processual para intentar ação revisional da aposentadoria do falecido segurado e da pensão por morte dela resultante, permitindo-lhes, como corolário, auferirem eventuais diferenças pecuniárias devidas e não prescritas, porém não pagas ao de cujus, sem subordinar o exercício do direito de ação a nenhuma iniciativa, judicial ou administrativa, do segurado em vida.

De fato, além da ausência de imposição expressa de outras condicionantes no texto legal enfocado, é inegável que embaraçar ou dificultar o direito de os legitimados buscarem valores devidos ao instituidor do benefício abre espaço para eventual – e indesejável – enriquecimento sem causa da Administração.

Por isso, consoante orientação jurisprudencial deste Superior Tribunal, ao perseguir a revisão da renda mensal da aposentadoria para que repercuta no cálculo da pensão por morte, o “pensionista que busca em juízo diferenças no benefício já em manutenção, ao qual tem direito, pleiteia em nome próprio direito próprio, não havendo que se cogitar de ofensa ao art. 6º do CPC (atual art. 18)” (Segunda Turma, AgRg no REsp n. 1.576.207/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 10/03/2016, DJe 16/03/2016).

Anote-se, por oportuno, que a legitimidade ativa de pensionistas para ajuizar ação revisional previdenciária foi adotada como premissa à conclusão alcançada pela Primeira Seção acerca da forma de contagem do prazo decadencial de revisão da aposentadoria e da pensão por morte. (EREsp 1.605.554/PR, Relatora p/ acórdão Ministra Assusete Magalhães, Primeira Seção, julgado em 27/02/2019, DJe 02/08/2019)

Nesse contexto, os dependentes habilitados à pensão por morte, e, na falta deles, os sucessores civilmente definidos, detêm legitimidade para figurarem no polo ativo de ação previdenciária revisional, ajuizada com o escopo de revisar, conforme o caso, a aposentadoria do de cujus (benefício originário) e/ou a pensão por morte dela decorrente (benefício derivado), bem como de perceberem as diferenças pecuniárias resultantes da readequação de ambos os benefícios, independentemente de iniciativa do titular em vida, e observada eventual ocorrência de decadência e de prescrição.


PRIMEIRA SEÇÃO

Processo

EREsp 1.404.931-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por maioria, julgado em 23/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO TRIBUTÁRIO

Tema

Parcelamento. Pagamento à vista. Art. 1º, § 3º da Lei n. 11.941/2009. Redução de 100% das multas de mora e de ofício. Redução de 45% sobre os juros de mora. Legalidade. Remissões distintas. Exegese firmada em julgamento de Recurso Repetitivo. Preservação da estabilidade dos precedentes.

Destaque

A redução de 45% dos juros de mora previsto no art. 1º, § 3º, da Lei n. 11.941/2009 para pagamento ou parcelamento de créditos tributários incide sobre a própria rubrica (juros de mora) em que se decompõe o crédito original, e não sobre a soma das rubricas “principal + multa de mora”.

Informações do Inteiro Teor

Cinge-se a controvérsia à interpretação da norma do art. 1º, § 3º, da Lei n. 11.941/2009, que possibilita reduzir as multas de mora e de ofício quando concedidos os parcelamentos de créditos tributários com fundamento na referida lei.

O acórdão embargado estabeleceu que “(…) O art. 1º, § 3º, I, da Lei n. 11.941/2009, expressamente dispõe que o contribuinte optante pelo pagamento à vista do débito fiscal será beneficiado com redução de 100% (cem por cento) do valor das multas moratória e de ofício. Segue-se, desse modo, que os juros de mora, cuja aplicação se entenda eventualmente devida sobre o valor das multas, incidirá, por força da própria previsão legal, sobre as bases de cálculo inexistentes, porquanto integralmente afastadas a priori pela lei, em consonância com o art. 155-A, § 1º, do CTN”.

Já no acórdão apontado como paradigma, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que: “(…) é que o inciso I do § 3º do art. 1º da Lei nº 11.941/2009, a despeito de ter reduzido em 100% (cem por cento) as multas de mora e de ofício, apenas reduziu em 45% (quarenta e cinco por cento) o montante relativo aos juros de mora”.

A orientação da Segunda Turma é que responde de modo tecnicamente mais adequado às questões acima pontuadas.

O art. 1º, § 3º, I, da Lei 11.941/2009, expressamente dispõe: “Observado o disposto no art. 3º desta Lei e os requisitos e as condições estabelecidos em ato conjunto do Procurador-Geral da Fazenda Nacional e do Secretário da Receita Federal do Brasil, a ser editado no prazo de 60 (sessenta) dias a partir da data de publicação desta Lei, os débitos que não foram objeto de parcelamentos anteriores a que se refere este artigo poderão ser pagos ou parcelados da seguinte forma: I – pagos a vista, com redução de 100% (cem por cento) das multas de mora e de ofício, de 40% (quarenta por cento) das isoladas, de 45% (quarenta e cinco por cento) dos juros de mora e de 100% (cem por cento) sobre o valor do encargo legal”.

Percebe-se que qualquer outra interpretação a ser dada ao dispositivo torna inócuas suas duas últimas partes que estabelecem remissão de 45% (quarenta e cinco por cento) dos juros de mora e de 100% (cem por cento) sobre o valor do encargo legal. Isso porque, caso recalculados os juros de mora e o encargo legal sobre débito não mais existente, não haveria mais nenhum valor sobre o qual pudessem incidir os percentuais de 45% e 100% de remissão, respectivamente.

Por ocasião do julgamento do REsp 1.251.513/PR (art. 543-C do CPC/1973), da relatoria do Min. Mauro Campbell Marques, a Primeira Seção do STJ endossou o entendimento acima delineado quando, nas razões de decidir do voto condutor, definiu que a redução de 45% dos juros de mora incide sobre a própria rubrica (juros de mora) em que se decompõe o crédito original, e não sobre a soma das rubricas “principal + multa de mora”.

Merece transcrição, nesse ponto, o seguinte excerto da referida decisão, que bem explica a forma de cálculo definida no art. 1º, § 3º, da Lei 11.941/2009: “(…) A remissão de juros moratórios, portanto, refere-se aos juros que compõem o crédito tributário e não aos juros que remuneram o depósito judicial. A este respeito, convém rememorar as parcelas ou rubricas que compõem o crédito tributário: Principal: é valor do tributo devido ou da multa isolada devida; Multa: é o valor da multa devida quanto atrelada ao principal, podendo ser de ofício, no caso de infração à legislação tributária, ou de mora, no caso de atraso no pagamento do principal; Juros de mora: são os juros incidentes em razão de atraso no pagamento do principal (art. 161, §1º, do CTN, atualmente a SELIC, por força do art. 61, §3º, da Lei n. 9.430/1996). Encargos: demais encargos incidentes sobre a dívida. No caso dos débitos inscritos em Dívida Ativa da União incide o encargo legal previsto no art. 1º, do Decreto-Lei n. 1.025/1969. (…) Se o contribuinte realiza o depósito integral após o encaminhamento do débito para inscrição em Dívida Ativa da União, tem-se o congelamento da seguinte composição do crédito tributário (CT): CT = R$ 100,00 (principal) + R$ 20,00 (multa de mora 20%) + R$ 1,20 (juros de mora 1%) + R$ 24,24 (encargo legal 20%) = TOTAL DE R$ 144,36 O depósito, para ser integral, deve ser feito no valor de R$ 144,36. Se o depósito foi assim efetuado, exige o art. 10, da Lei n. 11.941/2009, que, antes da transformação em pagamento definitivo (conversão em renda), seja aplicada a remissão/anistia sobre o crédito tributário, que passa a ter a seguinte composição (art. 1º, §3º, I, da Lei n. 11.941/2009): CT = R$ 100,00 (principal) + R$ 0,00 (anistia de 100% da multa de mora) + R$ 0,66 (remissão de 45% dos juros de mora) + R$ 0,00 (remissão de 100% do encargo legal) = TOTAL DE R$ 100,66”.

Conclui-se que a redução dos juros de mora em 45% deve ser aplicada, após a consolidação da dívida, sobre o próprio montante devido originalmente a esse título (juros de mora), faltando amparo legal para que a exclusão de 100% da multa de mora e de ofício implique exclusão proporcional dos juros de mora, sem que a lei assim o tenha definido de modo expresso. Como se vê, exegese em sentido contrário, além de ampliar o sentido da norma restritiva, esbarra na tese fixada em recurso repetitivo do STJ, instaurando, em consequência, indesejável insegurança jurídica no meio social.

Ressalta-se, por fim, a impossibilidade de interpretar de modo ampliativo e retroativo, sem expressa previsão legal, a norma que disciplina remissão de parte do crédito tributário (art. 111, I, do CTN) e a inviabilidade de fazer prevalecer, sem demonstração de mudança no panorama fático e jurídico, orientação jurisprudencial dissonante da estabelecida em recurso julgado no rito dos repetitivos.


PRIMEIRA TURMA

Processo

REsp 1.895.557-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO TRIBUTÁRIO

Tema

Protesto de CDA. Lei n. 9.492/1997. Norma nacional. Plena eficácia. Adoção por Fazenda Estadual e Municipal. Possibilidade. Lei local autorizativa. Desnecessidade.

Destaque

A validade do protesto de CDA emitida por Fazenda Pública Estadual ou Fazenda Municipal não está condicionada à previa existência de lei local que autorize a adoção dessa modalidade de cobrança extrajudicial.

Informações do Inteiro Teor

A Lei n. 12.767/2012 incluiu o parágrafo único no art. 1º da Lei n 9.492/1997, in verbis: “Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas.”

A interpretação desse dispositivo de lei federal já foi objeto de julgamento de recurso especial repetitivo (REsp 1.686.659/SP), tendo a Primeira Seção firmado a tese de que “a Fazenda Pública possui interesse e pode efetivar o protesto da CDA, documento de dívida, na forma do art. 1º, parágrafo único, da Lei n. 9.492/1997, com a redação dada pela Lei n. 12.767/2012” (Tema n. 777 do STJ).

O protesto de título de crédito é matéria afeta ao ramo do direito civil e comercial, cuja competência legislativa é privativa da União, conforme preconiza do art. 22, I, da Constituição Federal. Tem-se, assim, que essa norma federal é de caráter nacional e, por isso, dispensa autorização legislativa dos outros entes da federação para a sua pronta aplicação.

Basta, então, à Fazenda Pública credora atender ao procedimento previsto na própria Lei n. 9.492/1997 para obter o protesto de seu título de crédito, a CDA, não havendo necessidade de lei específica do ente tributante que preveja a adoção dessa medida, visto que a citada lei federal já é dotada de plena eficácia.

A propósito, a lei processual também é de competência legislativa privativa da União (art. 22, I, CF/88), sendo certo que a Lei n. 6.830/1980, que trata da “execução judicial da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias”, igualmente à Lei n. 9.492/1997, não contém nenhum dispositivo que condicione a sua imediata aplicação por Estados e Municípios à existência de lei de local autorizativa.

Se ambas as formas de cobrança estão previstas em lei federal de caráter nacional, caberá ao Poder Executivo eleger a mais adequada para obter a arrecadação de determinado crédito.

Ainda, o Poder Legislativo de cada ente federativo pode deliberar por restringir a atuação da sua Administração, estabelecendo, por exemplo, condições mínimas de valor e de tempo, para que a CDA seja levada a protesto, sendo certo que, na ausência dessas restrições legais ao protesto, não há óbice para que a Fazenda Pública cobre seu crédito por essa via extrajudicial, que, a toda evidência, é menos grave e onerosa em comparação com o ajuizamento de execução fiscal.

SEGUNDA TURMA

Processo

REsp 1.778.885-DF, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 15/06/2021, DJe de 21/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Cumprimento de sentença. Obrigação de fazer. Cômputo do prazo. Natureza processual. Dias úteis. Art. 219 do CPC.

Destaque

O prazo de cumprimento da obrigação de fazer possui natureza processual, devendo ser contado em dias úteis.

Informações do Inteiro Teor

O Superior Tribunal de Justiça, ao examinar a natureza do prazo fixado para o cumprimento das obrigações de pagar quantia certa, concluiu que “a intimação para o cumprimento de sentença, independentemente de quem seja o destinatário, tem como finalidade a prática de um ato processual, pois, além de estar previsto na própria legislação processual (CPC), também traz consequências para o processo, caso não seja adimplido o débito no prazo legal, tais como a incidência de multa, fixação de honorários advocatícios, possibilidade de penhora de bens e valores, início do prazo para impugnação ao cumprimento de sentença, dentre outras. E, sendo um ato processual, o respectivo prazo, por decorrência lógica, terá a mesma natureza jurídica, o que faz incidir a norma do art. 219 do CPC/2015, que determina a contagem em dias úteis” (REsp 1.708.348/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 25/6/2019, DJe 1º/8/2019).

A mesma ratio contida no precedente indicado acima deve ser aplicada ao momento a partir do qual se considera que houve o descumprimento das obrigações de fazer constantes do título judicial. Ainda que a prestação de fazer seja ato a ser praticado pela parte, não se pode desconsiderar a natureza processual do prazo judicial fixado para o cumprimento da sentença, o que atrai a incidência da regra contida no art. 219 do CPC.

Não se desconsidera que essa questão é controversa na doutrina. No entanto, a melhor interpretação é conferida por aqueles que defendem a contagem do prazo em dias úteis.

TERCEIRA TURMA

Processo

REsp 1.927.986-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021, DJe 25/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Arras. Art. 418 do Código Civil/2002. Inexecução contratual daquele que as recebeu. Devolução mais o equivalente. Cabimento.

Destaque

Da inexecução contratual imputável, única e exclusivamente, àquele que recebeu as arras, estas devem ser devolvidas mais o equivalente.

Informações do Inteiro Teor

Tradicionalmente, a doutrina classifica as arras em duas espécies, a depender da previsão, ou não, do direito de arrependimento. Em linhas gerais, se diz que as arras são “confirmatórias”, quando tornam o negócio irretratável, e que são “penitenciais” as arras previstas como penalidade à parte que desistir da avença, quando tal faculdade é convencionada.

O Código Civil de 1916 regulava a matéria no Capítulo III do Título IV do Livro III de sua Parte Especial, prevendo no art. 1.095 a devolução em dobro das arras tão somente na hipótese de arrependimento por parte de quem a recebeu. O Código Civil de 2002, por sua vez, ampliou a regulamentação da matéria.

No art. 420, correspondente ao art. 1.095 do CC/1916, substituiu o termo “dobro” por “equivalente”. Seguindo na mesma linha, o art. 418 do CC/2002 – que não encontra correspondente no Código anterior – emprega, outrossim, o termo “equivalente” e não “dobro”. O referido dispositivo legal, a rigor, veio preencher uma lacuna existente na legislação anterior, porquanto trata da hipótese mais ampla de inexecução contratual e não apenas de direito de arrependimento, matéria reservada ao art. 420 do mesmo Diploma.

Observa-se, desse modo, que, tanto na hipótese de direito de arrependimento quanto na de inexecução do contrato, à devolução das arras deverá ser somado o “equivalente” se aquele que se arrependeu ou inadimpliu foi quem as recebeu.

Examinando o art. 418 do CC/2002, esclarece a doutrina que a lei não mais utiliza o termo “dobro” tendo em vista o fato de que pode ser dado a título de arras bens diferentes do dinheiro, sendo preferível, portanto, a expressão “mais o equivalente” adotada pela novel legislação.

Sobre o tema, a Terceira Turma já teve a oportunidade de fixar o entendimento de que a restituição somada ao “equivalente”, quando a inexecução advém daquele que recebeu as arras, ocorre sejam elas confirmatórias, sejam elas penitenciais. De fato, “o que se diferencia, apenas, é a possibilidade de exigir indenização suplementar, o que não poderá ocorrer quando o contrato prevê direito ao arrependimento. Isso ocorre porque as partes, ao contratarem, entenderam por bem poderem desfazê-lo. O exercício desse direito ao arrependimento ou a inexecução culposa resolve-se, nestas hipóteses, pela devolução das arras” somada ao “equivalente” àquele que as deu, ou sua retenção, por quem as recebeu (AgInt no REsp 1.648.602/DF, Terceira Turma, julgado em 18/05/2020, DJe 21/05/2020).

Desse modo, seja a partir de uma interpretação histórica, seja a partir de uma exegese literal e sistemática, do exame do disposto no art. 418 do CC/2002 é forçoso concluir que, na hipótese de inexecução contratual imputável, única e exclusivamente, àquele que recebeu as arras, estas devem ser devolvidas mais o equivalente.


Processo

REsp 1.914.052-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL

Tema

Ação de alimentos. Cumprimento de sentença. Opção pelo rito da prisão civil (CPC/2015, ART. 528, § 3º). Suspensão de toda prisão civil, tanto em regime fechado, como em regime domiciliar, no âmbito do Distrito Federal, enquanto durar a pandemia do coronavírus. Adoção de atos de constrição no patrimônio do devedor, sem conversão do rito. Possibilidade.

Destaque

É possível a penhora de bens do devedor de alimentos, sem que haja a conversão do rito da prisão para o da constrição patrimonial, enquanto durar a impossibilidade da prisão civil em razão da pandemia do coronavírus.

Informações do Inteiro Teor

Da leitura do art. 528, §§ 1º a 9º, do Código de Processo Civil de 2015, extrai-se que, havendo prestações vencidas nos três meses anteriores ao ajuizamento da execução de alimentos, caberá ao credor a escolha do procedimento a ser adotado na busca pela satisfação do crédito alimentar, podendo optar pelo procedimento que possibilite ou não a prisão civil do devedor.

Caso opte pelo rito da penhora, não será admissível a prisão civil do devedor, nos termos do art. 528, § 8º, do CPC/2015. Todavia, se optar pelo rito da prisão, a penhora somente será possível se o devedor, mesmo após a sua constrição pessoal, não pagar o débito alimentar, a teor do que determina o art. 530 do CPC/2015.

Considerando a suspensão de todas as ordens de prisão civil, seja no regime domiciliar, seja em regime fechado, no âmbito do Distrito Federal, enquanto durar a pandemia do coronavírus, impõe-se a realização de interpretação sistemático-teleológica dos dispositivos legais que regem a execução de alimentos, a fim de equilibrar a relação jurídica entre as partes.

Se o devedor está sendo beneficiado, de um lado, de forma excepcional, com a impossibilidade de prisão civil, de outro é preciso evitar que o credor seja prejudicado com a demora na satisfação dos alimentos que necessita para sobreviver, pois não é possível adotar o entendimento de que o devedor estaria impossibilitado de promover quaisquer medidas de constrição pessoal (prisão) ou patrimonial, até o término da pandemia.

Ademais, tratando-se de direitos da criança e do adolescente, como no caso, não se pode olvidar que o nosso ordenamento jurídico adota a doutrina da proteção integral e do princípio da prioridade absoluta, nos termos do art. 227 da Constituição Federal.

Dessa forma, considerando que os alimentos são indispensáveis à subsistência do alimentando, possuindo caráter imediato, deve-se permitir, ao menos enquanto perdurar a suspensão de todas as ordens de prisão civil em decorrência da pandemia da Covid-19, a adoção de atos de constrição no patrimônio do devedor, sem que haja a conversão do rito.


Processo

REsp 1.930.865-TO, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021, DJe 25/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Cédula de crédito rural. Renegociação de dívida. Extinção da execução. Art. 12 da Lei n. 13.340/2016. Honorários advocatícios sucumbenciais. Não cabimento.

Destaque

A extinção da execução em virtude da renegociação de dívida fundada em cédula de crédito rural não impõe à parte executada o dever de arcar com as custas processuais e os honorários advocatícios em favor dos patronos da parte exequente.

Informações do Inteiro Teor

A condenação ao pagamento de honorários advocatícios é uma consequência objetiva da extinção do processo, sendo orientada, em caráter principal, pelo princípio da sucumbência e, subsidiariamente, pelo da causalidade.

Por opção de política legislativa, há normas especiais que excepcionam a aplicação dos princípios da sucumbência e da causalidade, isentando as partes do pagamento da verba honorária e, até mesmo, das custas e despesas processuais.

No que diz respeito, especificamente, à responsabilidade pelo pagamento dos honorários sucumbenciais na Lei n. 13.340/2016, deve-se destacar, de início, que a mencionada legislação teve por escopo possibilitar que as instituições financeiras e os devedores rurais renegociassem seus débitos, caso presentes os pressupostos nela enunciados.

A referida renegociação tem como resultado a extinção imprópria do processo executivo, porquanto não há o pagamento da dívida inscrita no título que o embasa, tendo a citada lei disposto expressamente, em seu art. 12, que, nessa hipótese, os honorários advocatícios são de responsabilidade de cada uma das partes e a falta de seu pagamento não obsta a liquidação ou repactuação da dívida, conforme o caso.

Ao examinar o referido dispositivo legal, deve-se ter presente que “se, por um lado, constituiu opção do legislador infraconstitucional destinar os honorários decorrentes da sucumbência ao advogado da parte vencedora, é certo que, em determinadas situações, o legislador deliberadamente isenta as partes do pagamento da verba, e, eventualmente, até mesmo das custas e despesas processuais” (REsp 1.836.470/TO, Terceira Turma, julgado em 02/02/2021, DJe 05/02/2021).

É, exata e precisamente, o que ocorre na hipótese de renegociação da dívida com base na Lei n. 13.340/2016, em que o legislador optou, no contexto de um plano de recuperação de dívidas de crédito rural, por não incrementar o dispêndio financeiro das partes – em especial do agricultor mutuário -, com o pagamento de honorários advocatícios à parte adversa.

Nesse passo, para além da reverência à opção legislativa, não se pode olvidar que o mencionado art. 12 da Lei n. 13.340/2016 prevalece sobre o disposto no art. 85 do CPC/2015 e nos arts. 23 e 24 da Lei n. 8.906/1994, ante o princípio da especialidade das normas.

Desse modo, ante o disposto no art. 12 da Lei 13.340/2016, a extinção da execução em virtude da renegociação de dívida fundada em cédula de crédito rural não impõe à parte executada o dever de arcar com as custas processuais e os honorários advocatícios em favor dos patronos da parte exequente.


Processo

REsp 1.935.842-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021, DJe 25/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Bem de família. Financiamento da construção ou aquisição. Exceção à impenhorabilidade. Art. 3º, II, da Lei n. 8.009/1990. Recursos oriundos da venda desse bem. Aquisição de novo imóvel. Penhorabilidade. Possibilidade.

Destaque

A exceção à impenhorabilidade do bem de família, prevista para o crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, estende-se ao imóvel adquirido com os recursos oriundos da venda daquele bem.

Informações do Inteiro Teor

Inicialmente, importa consignar que a impenhorabilidade do bem de família funda-se na consideração de que, em determinadas hipóteses, com o objetivo de tutelar direitos e garantias fundamentais, o legislador buscou prestigiar o interesse do devedor em detrimento dos interesses do credor.

No entanto, especificamente aos bens de família, o art. 3º da Lei n. 8.009/1990 estabelece uma série de exceções à impenhorabilidade.

Nesse contexto, o inciso II do art. 3º da Lei n. 8.009/1990, na linha do que preceitua o § 1º do art. 833 do CPC/2015, dispõe que a impenhorabilidade do bem de família não prevalece na hipótese de processo de execução movido “pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato”.

Se o primitivo bem de família pode ser penhorado para a satisfação de dívida relativa ao próprio bem, o novo bem de família, adquirido com os recursos da alienação do primeiro, também estará sujeito à referida exceção.

Desse modo, não pode o devedor adquirir novo bem de família com os recursos provenientes da venda de bem de família anterior para, posteriormente, se furtar ao adimplemento da dívida contraída com a compra do primeiro, notadamente tendo em vista a máxima de que a ninguém é dado beneficiar-se da própria torpeza.

Muito embora seja certo que a exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no inciso II do art. 3º da Lei n. 8.009/90 transmite-se ao novo bem de família adquirido, é imprescindível que se comprove que este, de fato, foi adquirido com os recursos da venda daquele.


Processo

REsp 1.940.016-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Pedido reconvencional. Requisitos. Atendimento. Nomen iuris. Irrelevância.

Destaque

A equivocada denominação do pedido reconvencional como pedido contraposto não impede o regular processamento da pretensão formulada pelo réu contra o autor, desde que ela esteja bem delimitada na contestação.

Informações do Inteiro Teor

Com as inovações trazidas pelo CPC/2015, o oferecimento de reconvenção passou a ser feito na própria contestação, sem maiores formalidades, diferentemente do CPC/1973, que determinava a sua apresentação em peça autônoma.

Quanto ao mais, foram mantidos os demais requisitos próprios do instituto, que, a rigor, não se diferenciam daqueles exigidos para qualquer outro tipo de demanda judicial, visto que a reconvenção nada mais é do que uma ação autônoma do réu voltada contra o autor.

Também é necessário que o pedido reconvencional esteja bem delimitado na contestação, de modo a assegurar o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa pelo autor/reconvindo.

Desse modo, desde que observados esses requisitos, o magistrado não deve apegar-se a meras formalidades, o que só iria de encontro aos princípios da razoável duração do processo e da economia processual.

Essa, por sinal, é a compreensão que deu ensejo à edição do Enunciado n. 45 do Fórum Permanente dos Processualistas Civis (FPPC): “Para que se considere proposta a reconvenção, não há necessidade de uso desse nomen iuris, ou dedução de um capítulo próprio. Contudo, o réu deve manifestar inequivocamente o pedido de tutela jurisdicional qualitativa ou quantitativamente maior que a simples improcedência da demanda inicial”.

De fato, a motivação jurídica apresentada na petição inicial e o nomen iuris atribuído à demanda não vinculam o juízo, de acordo com os brocardos da mihi factum dabo tibi ius (dá-me os fatos que te darei o direito) e iura novit curia (o juiz é quem conhece o direito), entendimento que também deve ser aplicado à reconvenção.

No caso, a denominação do pedido reconvencional como pedido contraposto não causou nenhum prejuízo à defesa da reconvinda, considerando que a pretensão da reconvinte foi bem delimitada na contestação, em capítulo próprio. Além disso, à reconvinda, devidamente intimada para apresentar resposta, foi garantida a mais ampla possibilidade de defesa, tendo ela se manifestado quanto ao pedido reconvencional em diversas oportunidades.


Processo

REsp 1.915.736-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO AGRÁRIO

Tema

Execução. Cédula de Produto Rural Financeira. Natureza cambial. Circularidade. Apresentação do original do título executivo. Formato cartular. Necessidade.

Destaque

Na execução de cédula de produto rural em formato cartular é necessária a juntada do original do título de crédito, salvo se comprovado que o título não circulou.

Informações do Inteiro Teor

Nos termos do art. 798, I, do CPC/2015, ao propor a execução, incumbe ao exequente instruir a petição inicial com, dentre outros documentos, o título executivo extrajudicial.

A juntada da via original do título executivo extrajudicial é, em princípio, requisito essencial à formação válida do processo de execução, visando a assegurar a autenticidade da cártula apresentada e a afastar a hipótese de ter o título circulado, sendo, em regra, nula a execução fundada em cópias dos títulos.

A execução pode, excepcionalmente, ser instruída por cópia reprográfica do título extrajudicial em que fundamentada, prescindindo da apresentação do documento original, principalmente quando não há dúvida quanto à existência do título e do débito e quando comprovado que o mesmo não circulou.

Contudo, por ser a cédula de produto rural título dotado de natureza cambial, tendo como um dos seus atributos a circularidade, mediante endosso, conforme previsão do art. 10, I, da Lei n. 8.929/1994, a apresentação do documento original faz-se necessário ao aparelhamento da execução, se não comprovado pelas instâncias ordinárias que o título não circulou.

Vale lembrar que não se descura que os documentos juntados ao processo eletrônico são considerados originais para todos os efeitos legais, consoante previsão contida nos arts. 11 da Lei n. 11.419/2006 e 425 do CPC/2015.

Ocorre que essa regra deve ser mitigada quando se trata de título executivo extrajudicial, tendo em vista a possibilidade de determinação de depósito do documento original em cartório ou secretaria, conforme preconiza o art. 425, § 2º, do CPC/2015: “Tratando-se de cópia digital de título executivo extrajudicial ou de documento relevante à instrução do processo, o juiz poderá determinar seu depósito em cartório ou secretaria.”

Desse modo, mostra-se prudente, na espécie, por se tratar de um título de crédito passível de circularidade, a exigência do original da cédula para evitar o ajuizamento de múltiplas execuções fundadas em cópias distintas do título.

Ressalva-se, após sugestão do Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, que o referido entendimento é aplicável às hipóteses de emissão das CPRs em data anterior à vigência da Lei n. 13.986/2020, tendo em vista que a referida legislação modificou substancialmente a forma de emissão destas cédulas, passando a admitir que a mesma se dê de forma cartular ou escritural (eletrônica). A partir de sua vigência, a apresentação da CPR original faz-se necessária ao aparelhamento da execução somente se o título exequendo for apresentado no formato cartular.


Processo

REsp 1.924.580-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021, DJe 25/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL, DIREITO FALIMENTAR

Tema

Recuperação extrajudicial. Homologação do plano apresentado pelo devedor. Impugnação. Honorários advocatícios sucumbenciais. Cabimento.

Destaque

Havendo impugnação pelos credores, é cabível a fixação de honorários advocatícios sucumbenciais em procedimento de homologação do plano de recuperação extrajudicial.

Informações do Inteiro Teor

Além da recuperação judicial e da falência, a Lei n. 11.101/2005 trouxe outra solução para que sociedades empresárias em situação de crise econômico-financeira possam se reabilitar e continuar suas atividades: a recuperação extrajudicial, prevista nos arts. 161 a 167 do diploma legal em questão.

Trata-se, em linhas gerais, de um meio formal de acordo especial entabulado entre o devedor e seus credores que, sob certas circunstâncias, pode ser imposto a uma minoria que oferecer resistência à sua efetivação, haja vista o fato de a LFRE privilegiar o interesse social na manutenção da atividade empresarial sobre os interesses específicos de cada um dos credores.

A Lei n. 11.101/2005 é silente quanto à possibilidade ou não de arbitramento de honorários advocatícios sucumbenciais nas hipóteses de deferimento ou de rejeição do pedido de homologação do plano de recuperação extrajudicial apresentado pelo devedor.

Todavia, o art. 189 desse diploma legal determina que, aos procedimentos nela previstos (recuperação judicial, extrajudicial e falência), devem ser aplicados de forma supletiva (“no que couber”) as disposições do Código de Processo Civil. E, como é cediço, o art. 85, caput, do CPC/2015 estabelece que “[a] sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor”.

Assim, o vetor primordial que orienta a imposição ao pagamento de verba honorária sucumbencial, portanto, é o fato da derrota na demanda, cujo pressuposto é a existência de litigiosidade.

Outro ponto que merece realce é o fato de a Lei n. 11.101/2005 conferir ao ato judicial que decide acerca do pedido de homologação do plano de recuperação extrajudicial a natureza de sentença (arts. 161, § 6º, e 164, §§ 5º e 7º), circunstância que, a se considerar a literalidade da norma do precitado art. 85, caput, do CPC/2015, impõe ao julgador a condenação do vencido ao pagamento de honorários ao advogado do vencedor.

Importa consignar, outrossim, que a LFRE não prevê – diferentemente do que ocorre com as impugnações de crédito apresentadas em procedimento de recuperação judicial (art. 13, parágrafo único) – que as impugnações ao plano de recuperação extrajudicial sejam autuadas em apartado, de modo que, nestas hipóteses, incumbe ao juiz apreciar as objeções deduzidas pelos credores na própria sentença.

É bem verdade que, quando não impugnado, o pedido de homologação de plano de recuperação extrajudicial apresenta características análogas a de um procedimento de jurisdição voluntária, nos quais, não havendo vencedores ou vencidos (dada a ausência de litigiosidade), afigura-se despropositado o arbitramento de honorários sucumbenciais.

Todavia, a apresentação de impugnação ao pedido homologatório por parte de credores é circunstância que confere litigiosidade ao procedimento, razão pela qual a regra de não cabimento da condenação em honorários deve ceder. E, nesse panorama, o fato de se tratar de pedido homologatório, por si só, não autoriza a conclusão de que é incabível o arbitramento de honorários advocatícios de sucumbência

De se notar, ademais, que, quando pretendeu que não houvesse a fixação de honorários advocatícios, a Lei n. 11.101/2005 assim previu expressamente, como nas hipóteses de seus arts. 7º-A, § 8º, e 88, parágrafo único.

Por fim, constata-se que a judicialização do procedimento, no caso, afigurava-se imprescindível para a obtenção do resultado desejado – eficácia do plano recuperacional sobre a totalidade dos créditos passíveis de serem a ele submetidos -, haja vista que o devedor não conseguiu alcançar, na esfera extrajudicial, a unanimidade necessária para dispensar a intervenção judicial.

Assim, considerando que a decisão homologatória do pedido de recuperação extrajudicial possui natureza de sentença, pondo fim à atividade jurisdicional, e que, no particular, as diversas impugnações apresentadas conferiram litigiosidade ao procedimento, inexiste razão jurídica apta a desautorizar o arbitramento dos honorários de sucumbência.


Processo

REsp 1.941.005-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado 22/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO URBANÍSTICO

Tema

Loteamento urbano. Taxas de manutenção. Associação de moradores. Aquisição de imóvel. Contrato-padrão registrado. Responsabilidade dos adquirentes. Débitos anteriores. Inocorrência. Ausência de previsão expressa na Lei n. 6.766/1979.

Destaque

A taxa de manutenção de loteamento urbano cobrada por associação de moradores, prevista no contrato-padrão registrado no Cartório de Imóveis, vincula os adquirentes somente à obrigação de pagar as taxas a partir da aquisição, não abrangendo os débitos do anterior proprietário.

Informações do Inteiro Teor

A jurisprudência do STJ está assentada no sentido de que a taxa de manutenção cobrada por associação de moradores tem natureza pessoal, não se equiparando a despesas condominiais.

Ademais, no julgamento do REsp 1.439.163/SP e do REsp 1.280.871/SP, submetidos ao rito dos recursos repetitivos, restou fixado o entendimento de que as taxas instituídas por associação de moradores e/ou condomínios de fato não alcançam quem não é associado ou que não tenha aderido ao ato que instituiu o encargo.

Também foi objeto de discussão nesta Corte a possibilidade de cobrança da taxa de manutenção na hipótese de ela estar prevista no contrato-padrão que acompanha o projeto de loteamento registrado no Cartório de Registro de Imóveis, ficando estabelecido que as obrigações constantes do contrato-padrão vinculam os adquirentes.

No caso, a discussão gira em torno de definir se o fato de a cobrança de taxa de manutenção estar prevista no contrato-padrão registrado vincula os adquirentes não somente à obrigação de pagar as taxas de associação a partir da aquisição, como também a responder pelos débitos do anterior proprietário.

Em outras palavras, definir se o depósito do contrato padrão no Cartório de Registro de Imóveis transforma a obrigação de pagar a taxa de manutenção e limpeza em propter rem, de modo que obriga a cadeia de adquirentes do imóvel.

A esse respeito é preciso ponderar que um dos principais objetivos do registro imobiliário do projeto de parcelamento urbano, com a previsão de depósito de diversos documentos (artigo 18 da Lei n. 6.766/1979), dentre eles o contrato padrão (artigo 26 da Lei n. 6.766/1979), é proteger os adquirentes dos lotes.

Nesse contexto, se o intuito é proteger os adquirentes, a interpretação da norma que impõe obrigações e responsabilidades não pode ser feita extensivamente.

Com efeito, conforme se extrai da leitura do artigo 29 da Lei n. 6.766/1979 não existe previsão expressa de que o adquirente responderá pelos débitos dos antigos proprietários mas, tão somente, que sucederá o transmitente em suas obrigações, isto é, na obrigação de pagar a taxa de manutenção.

De fato, quando a lei estabelece a responsabilidade de o adquirente responder pelos débitos do alienante, como ocorre no caso de condomínio edilício, o faz expressamente e de forma inequívoca, consoante se verifica do artigo 1.345 do Código Civil.

O fato de o contrato padrão ter sido levado a registro, permitindo que seja consultado por qualquer interessado, além de ter sido reproduzido em parte na matrícula do imóvel, apenas indica que os compradores foram cientificados de que estariam aderindo à cobrança de uma taxa de manutenção e não de que responderiam por débitos de antigo proprietário, que nem sequer era o titular do domínio na época da arrematação.


QUARTA TURMA

Processo

REsp 1.850.961-SC, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por maioria, julgado em 15/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR

Tema

Seguro de vida em grupo. Responsabilidade de prestar informações aos aderentes. Dever do estipulante. Representante dos segurados.

Destaque

Nos contratos de seguro de vida em grupo, a obrigação de prestar informações aos segurados recai sobre o estipulante.

Informações do Inteiro Teor

Inicialmente, a configuração legal do seguro coletivo impõe que esta modalidade de contrato – denominado pela doutrina de principal (ou mestre) – seja celebrado entre a entidade seguradora e pessoa natural ou jurídica (estipulante), representando os interesses de um grupo de pessoas, de qualquer modo a ela vinculadas, denominados segurados após subscreverem as propostas de adesão a eles oferecidas, dando origem a relações jurídicas individuais distintas.

Portanto, no seguro de vida em grupo, o estipulante é o mandatário dos segurados, sendo por meio dele encaminhadas as comunicações entre a seguradora e os consumidores aderentes.

Nesse contexto, o dever de informação, na fase pré-contratual, é satisfeito durante as tratativas entre seguradora e estipulante, culminando com a celebração da apólice coletiva que estabelece as condições gerais e especiais e cláusulas limitativas e excludentes de riscos.

Na fase de execução do contrato, o dever de informação, que deve ser prévio à adesão de cada empregado ou associado, cabe ao estipulante, único sujeito do contrato que tem vínculo anterior com os componentes do grupo segurável. A seguradora, na fase prévia à adesão individual, momento em que devem ser fornecidas as informações ao consumidor, sequer tem conhecimento da identidade dos interessados que irão aderir à apólice coletiva cujos termos já foram negociados entre ela e o estipulante.

A obrigação de prestar informações sobre os termos, condições gerais e cláusulas limitativas de direito estabelecidos no contrato de seguro de vida em grupo ao qual aderiu ao segurado (consumidor) é, pois, do estipulante, conforme estabelecido no inc. III, do art. 3º, da Resolução CNSP 107/2004, constituindo-se esse dever em pressuposto lógico da aceitação da proposta de adesão pelo interessado.

Processo

REsp 1.353.300-DF, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO MARCÁRIO

Tema

Agremiações políticas. Registro de símbolos políticos como marca. Exploração econômica. Possibilidade

Destaque

O símbolo partidário pode ser registrado como marca para que se resguarde a exploração econômica por agremiações políticas (associações civis ou partidos) do uso de marca de produtos/serviços, ainda que não exerçam precipuamente atividade empresarial.

Informações do Inteiro Teor

Trata-se da possibilidade de símbolos políticos serem registrados como marca, bem como das agremiações políticas, sejam elas associações civis ou partidos, de explorarem economicamente o uso de marca de produto, apesar de não exercerem diretamente atividade empresarial.

A identificação de um partido político transita e coexiste nas esferas privada e pública. Por conseguinte, os seus símbolos alcançam dois regimes de proteção: o da Lei n. 9.096/1995, no que se refere ao uso para finalidade eleitoral; e, ainda, o da Lei n. 9.279/1996, relativamente à exploração econômica.

Nesse contexto, afigura-se viável a dupla proteção legal, porquanto ainda que fora do período e da esfera eleitoral, o partido político, como forma de autofinanciamento, pode explorar economicamente o seu símbolo mediante o licenciamento de produtos ou serviços dos quais tenha registro marcário.

O símbolo partidário está regulado no art. 7º, § 3º, da Lei n. 9.096/1995, sendo-lhe assegurado, após o registro no Tribunal Superior Eleitoral, proteção no âmbito eleitoral com a finalidade única de evitar a confusão de siglas partidárias perante os eleitores durante o processo democrático de votação. Esse é o alcance da legislação eleitoral: a vedação de utilização de signos de identificação que possam induzir o eleitorado ao erro ou à confusão. Seu espectro de delimitação se circunscreve, portanto, à identificação com os eleitores, inexistindo qualquer restrição expressa nesse regramento legal que impeça de modo específico sua proteção quanto ao uso e exploração nos atos submetidos à regulação da lei civil.

Nada impede, portanto, ante a inexistência de vedação legal expressa, que o símbolo de uma agremiação política seja registrado como marca para o fim de se resguardar a sua exploração econômica.

E, nos termos dos arts. 122 e 123 da Lei n. 9.279/1996, a marca é todo sinal distintivo, visualmente perceptível, que identifica e distingue produtos e serviços, de origem diversas de outro idêntico ou semelhante de origem diversa.

Outrossim, a legislação de regência ao dispor sobre a legitimidade dos requerentes do registro, em capítulo próprio, não limita de forma expressa a proteção da marca, enquanto signo distintivo, às atividades empreendidas ou exercidas apenas por pessoas empresárias. Não há essa restrição, pois a forma empresarial é apenas uma das maneiras para se exercer a atividade econômica que terá a marca protegida.

Conforme se entende da análise gramatical do art. 124, XIII, da Lei n. 9.279/1996, o que se veda é o registro do nome, do prêmio ou do símbolo de eventos, sejam eles na modalidade esportiva, artística, cultural, social, política, econômica ou técnica. Tanto é assim que o trecho ao final ressalva a possibilidade de seus registros, caso seja autorizado pela autoridade competente ou entidade promotora do evento.

Desse modo, fazem jus à proteção legal o nome e o sinal que integram sua personalidade jurídica, enquanto direito fundamental, que os identificam e os individualizam em suas relações com terceiros. E, assim, ocorre no âmbito do direito civil, mediante a obtenção de proteção às suas marcas, as quais particularizam o ente privado diante de um potencial público de consumo ou de seus simpatizantes, mediante a comercialização direta ou indireta (licenciamento) de produtos voltados à promoção e ao fomento de uma ideologia política.

Por fim, o licenciamento da exploração de símbolos ou emblemas de partidos políticos podem ser licitamente explorados enquanto marcas de identificação de ideologia perante o público, como forma de autofinanciamento. Não há, em conclusão, qualquer vedação prevista em lei que impossibilite o registro de símbolos partidários enquanto marcas, nos termos de ambas as leis de regência.


RECURSOS REPETITIVOS – AFETAÇÃO

Processo

ProAfR no REsp 1.846.649-MA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 23/06/2021. (Tema 1061)

Ramo do Direito

DIREITO DO CONSUMIDOR, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

A Segunda Seção acolheu questão de ordem para redefinição da questão a ser discutida no recurso especial afetado, restringindo-se a controvérsia da afetação apenas ao item 1.3 da proposta aprovada pela Segunda Seção do STJ (tema 1061), a seguir: Nas hipóteses em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante do contrato juntado ao processo, cabe à instituição financeira/ré o ônus de provar essa autenticidade (CPC, art. 429 II), por intermédio de perícia grafotécnica ou mediante os meios de prova legais ou moralmente legítimos (CPC, art. 369).