CLIPPING – DIREITO PÚBLICO EDIÇÃO N 2.932 – DEZ/2025

DESTAQUE DE JURISPRUDÊNCIA STJ

 

Informativo Nº 873, de 09 de dezembro de 2025.

 

PRIMEIRA TURMA

 

Processo

AgInt no REsp 2.092.441-DF, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 3/11/2025, DJEN 6/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Empresa pública prestadora de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem finalidade lucrativa. Submissão ao regime de precatórios. Equiparação com a Fazenda Pública.

Destaque

As empresas públicas prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem finalidade lucrativa, fazem jus ao processamento da execução por meio de precatório.

 

Processo

REsp 1.974.556-SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025, DJEN 12/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO TRIBUTÁRIO

Tema

Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN ou ISS). Intermediação de serviços turísticos. Exportação de serviços. Não ocorrência.

Destaque

Não cabe a isenção do ISS, prevista no art. 2º, I, da LC n. 116/2003, para a intermediação de serviços de turismo e viagens internacionais realizada inteiramente em território nacional.

 

SEGUNDA TURMA

 

Processo

RMS 76.772-MT, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 12/11/2025, DJEN 17/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

Tema

Licitação. Edital de pregão eletrônico. Estruturação em lote único. Legalidade. Discricionariedade da Administração.

Destaque

Em que pese o princípio do parcelamento nas licitações, a opção administrativa pela estruturação do objeto licitatório em lote único, quando fundamentada em razões técnicas adequadas e amparada pelo art. 40, § 3º, I, da Lei n. 14.133/2021, não configura ato abusivo ou ilegal, inserindo-se no legítimo exercício da discricionariedade administrativa.

 

Processo

AgInt no REsp 1.773.335-SP, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 12/11/2025, DJEN 17/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

Tema

Ação popular. Condenação. Ressarcimento ao erário. Dano presumido. Impossibilidade.

Destaque

Não é possível a condenação, em ação popular, ao ressarcimento ao erário com base em dano presumido, sem comprovação efetiva de prejuízo financeiro e não apontado na petição inicial nexo causal e efetividade do dano para a responsabilização.

 

TERCEIRA TURMA

 

Processo

REsp 2.230.995-GO, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/11/2025, DJEN 26/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO CONSTITUCIONAL

Tema

Ação indenizatória. Reportagem jornalística. Finalidade informativa. Excesso. Violação dos direitos da personalidade. Ilicitude da conduta. Possibilidade de ressarcimento dos danos.

Destaque

Verificado o excesso de reportagem decorrente do desbordo dos fins informativos, devem prevalecer os direitos da personalidade com o consequente ressarcimento dos danos correlatos.

 

Processo

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025, DJEN 7/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Ação de reconhecimento de união estável homoafetiva post mortem. Requisitos para a configuração de união estável homoafetiva. Art. 1.723 do CC. Publicidade. Relativização. Possibilidade.

Destaque

É possível a relativização do requisito da publicidade para a configuração de união estável homoafetiva, desde que presentes os demais requisitos caracterizadores da união estável previstos no art. 1.723 do CC.

 

Processo

REsp 2.207.934-RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 11/11/2025, DJEN 28/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL

Tema

Ação de responsabilidade. Administradores. Sociedade anônima. Corrupção corporativa. Simulação. Ocorrência. Ata da assembleia que aprovou as contas prestadas pelos administradores. Prévia anulação. Necessidade. Condição de procedibilidade.

Destaque

Nos casos de ação de responsabilidade de administradores fundada em alegada prática de atos de corrupção corporativa, a prévia anulação das atas assembleares nas quais houve a aprovação das contas por eles apresentadas constitui condição de procedibilidade.

 

QUARTA TURMA

 

Processo

REsp 2.081.015-SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 24/11/2025, DJEN 3/12/2025.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Prescrição. Prescrição intercorrente atinge apenas a pretensão (o direito de ação). Levantamento de depósito judicial. Impossibilidade de devolução. Art. 882 do CC/2002.

Destaque

Mesmo diante do reconhecimento da prescrição intercorrente, o pagamento de obrigação judicialmente inexigível não confere direito à repetição do indébito.

 

QUINTA TURMA

 

Processo

AgRg no REsp 2.098.118-MG, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 29/10/2025, DJEN 4/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PENAL

Tema

Roubo impróprio. Violência posterior à subtração. Configuração.

Destaque

A expressão “logo depois” utilizada no art. 157, § 1º, do Código Penal, no crime de roubo impróprio, não exige que a violência ocorra imediatamente após a subtração, admitindo-se algum lapso temporal entre os eventos.

 

Processo

AgRg no HC 1.017.622-SC, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 19/11/2025, DJEN 26/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PENAL

Tema

Cultivo doméstico de cannabis sativa. Finalidade medicinal. Necessidade terapêutica comprovada. Pendência de regulamentação específica. Salvo-conduto. Possibilidade.

Destaque

É possível a concessão de salvo-conduto para o cultivo de cannabis sativa para fins medicinais, desde que comprovada a necessidade terapêutica por documentação idônea, até que haja regulamentação específica pelo Poder Executivo Federal.

 

Processo

EDcl no AREsp 2.802.065-PR, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 11/11/2025, DJEN 19/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Tribunal do Júri. Materialidade e autoria reconhecidas. Absolvição pelo quesito genérico. Ausência de tese defensiva. Decisão manifestamente contrária à prova dos autos.

Destaque

A ausência de tese defensiva registrada em ata que justifique a absolvição por clemência ou outra causa correlata, aliada à contradição entre as respostas dos jurados, autoriza a anulação do julgamento e a realização de novo júri.

 

SEXTA TURMA

 

Processo

HC 1.035.054-SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 18/11/2025, DJEN 27/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Apreensão de celular. Relatório de investigação. Imagens de tela de aplicativo de mensagem obtidas ilicitamente. Posterior extração de dados com autorização judicial. Fonte independente. Prova lícita.

Destaque

Apesar da ilicitude do conteúdo do relatório de investigação com imagens de captura de tela (prints ou screenshots) de conversas de WhatsApp, a posterior extração dos dados do aparelho celular da paciente realizada com autorização judicial permite classificar tais provas como de fonte independente, nos termos do art. 157, § 2º, do Código de Processo Penal.

 

JURISPRUDÊNCIA

 

STJ

 

Informativo
Nº 873, de 09 de dezembro de 2025.

 

Este periódico, elaborado pela Secretaria de Jurisprudência do STJ, destaca teses jurisprudenciais firmadas pelos órgãos julgadores do Tribunal nos acórdãos incluídos na Base de Jurisprudência do STJ, não consistindo em repositório oficial de jurisprudência.

 

PRIMEIRA TURMA

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Processo

AgInt no REsp 2.092.441-DF, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 3/11/2025, DJEN 6/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Empresa pública prestadora de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem finalidade lucrativa. Submissão ao regime de precatórios. Equiparação com a Fazenda Pública.

Destaque

As empresas públicas prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem finalidade lucrativa, fazem jus ao processamento da execução por meio de precatório.

Informações do Inteiro Teor

 

Controverte-se acerca da possibilidade de sujeição de empresa pública prestadora de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem finalidade lucrativa, ao regime de precatórios para a satisfação de seus débitos.

Com efeito, observa-se uma tendência jurisprudencial do STF de enquadrar empresas estatais monopolistas no conceito de Fazenda Pública para diversas finalidades, pois, na sua compreensão, a empresa, “não estando sujeita à concorrência privada, está mais próxima de um ente estatal que de uma empresa privada, não sendo lógico aplicar-se a regra niveladora do art. 173, § 1º, da Carta da República” (ADI 3396, Rel. Ministro Nunes Marques, Tribunal Pleno, julgado em 23/6/2022).

Essa realidade é perceptível em outros julgados do STF, como no RE 407.099, em que se reconheceu que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), por exercer atividade em regime de monopólio, faz jus à imunidade tributária recíproca prevista entre os entes federados; já no RE 627.242, firmou-se o entendimento de que sociedade de economia mista estadual que presta serviço público essencial em regime de monopólio não pode ter seus bens submetidos à penhora.

Cita-se ainda o precedente do Supremo Tribunal Federal (STF), ADPF 949, Rel. Ministro Nunes Marques, julgado em 4/9/2023, que enquadrou uma empresa pública prestadora de serviço público essencial em regime não concorrencial no conceito de Fazenda Pública, para fins de incidência do art. 100 da Constituição Federal.

Nesse contexto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), alinhando-se ao entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), firmou-se no sentido de que as empresas públicas prestadoras de serviço público essencial em regime não concorrencial, o qual corresponde à própria atuação do Estado, haja vista não possuírem finalidade lucrativa, fazem jus ao processamento da execução por meio de precatório.

Informações Adicionais

Legislação

Constituição Federal, art. 100; e art. 173, § 1º.

Precedentes Qualificados

ADPF 949.

ADI 3396.


 

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Processo

REsp 1.974.556-SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025, DJEN 12/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO TRIBUTÁRIO

Tema

Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN ou ISS). Intermediação de serviços turísticos. Exportação de serviços. Não ocorrência.

Destaque

Não cabe a isenção do ISS, prevista no art. 2º, I, da LC n. 116/2003, para a intermediação de serviços de turismo e viagens internacionais realizada inteiramente em território nacional.

Informações do Inteiro Teor

Na hipótese, uma empresa intermediária de serviços de turismo e viagens controverte acerca do pagamento de Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN ou ISS) relativamente ao agenciamento de viagens internacionais.

Com efeito, tem-se que a isenção prevista no art. 2º, I, da Lei Complementar n. 116/2003 demanda a análise do conceito de “resultado”, uma vez que a não incidência do tributo municipal (ISS) sobre as exportações de serviços depende do local do resultado, se ocorrido no Brasil ou no exterior.

No caso, o contrato questionado concretiza-se entre a empresa e o cliente (viajante) facilitando a compra de serviços turísticos, como hotéis e locadoras de veículos no exterior. A referida atividade inicia-se no território nacional brasileiro e aqui produz seu resultado, porquanto mera intermediação, ainda que para serviços turísticos fora do Brasil. Não há, nesse caso, falar em fruição dos efeitos no exterior.

Destarte, a atividade esgota-se na aproximação de pretensos viajantes e fornecedores estrangeiros, intermediação que se realiza inteiramente em território nacional com a efetivação da reserva de hotéis, locação de carros.

Assim, não é o caso da isenção do ISS prevista no art. 2º, I, da LC n. 116/2003.

Informações Adicionais

Legislação

Lei Complementar n. 116/2003, art. 2º, I.



 

SEGUNDA TURMA

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Processo

RMS 76.772-MT, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 12/11/2025, DJEN 17/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

Tema

Licitação. Edital de pregão eletrônico. Estruturação em lote único. Legalidade. Discricionariedade da Administração.

Destaque

Em que pese o princípio do parcelamento nas licitações, a opção administrativa pela estruturação do objeto licitatório em lote único, quando fundamentada em razões técnicas adequadas e amparada pelo art. 40, § 3º, I, da Lei n. 14.133/2021, não configura ato abusivo ou ilegal, inserindo-se no legítimo exercício da discricionariedade administrativa.

Informações do Inteiro Teor

No caso, foi impetrado Mandado de segurança coletivo contra ato de Secretário de Estado de Educação, consistente na publicação de edital de pregão eletrônico destinado à formação de registro de preços para aquisição de kits de material escolar estruturado em lote único.

O Tribunal de Justiça do Estado denegou a segurança sob o fundamento de que a estruturação do certame em lote único foi devidamente justificada com base no art. 40, § 3º, I, da Lei n. 14.133/2021, e que a ausência de regionalização não configura ilegalidade, desde que a Administração apresente justificativa técnica plausível.

Sobre o tema, cumpre salientar que o princípio do parcelamento previsto na Lei n. 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos) recomenda que haja divisão de um objeto de compra ou serviço em itens ou lotes menores sempre que for tecnicamente viável e economicamente vantajoso para a Administração, objetivando ampliar a competição com vistas à economicidade.

Existem, entretanto, situações em que o parcelamento pode se mostrar inviável ou desvantajoso, como no caso em questão, em que a Administração apresentou justificativa técnica para a opção do lote único.

Assim, em que pese o princípio do parcelamento nas licitações, inexiste ilegalidade na opção administrativa pela estruturação do objeto em lote único, inserindo-se referida opção no legítimo exercício da discricionariedade atribuída ao administrador na consecução do interesse público.

Ainda, deve ser ressaltado que, embora a Lei Complementar n. 123/2006 e o Decreto n. 8.538/2015 prevejam medidas de fomento às microempresas e empresas de pequeno porte, a não adoção da regionalização ou de quotas para MPEs não causa, por si só, nulidade do certame, especialmente considerando ter a Administração apresentado justificativa técnica plausível.

Portanto, restando observados os critérios da oportunidade e conveniência da Administração Pública, inexiste ilegalidade no referido Edital de Pregão Eletrônico, sendo desnecessário o controle do ato administrativo pelo Judiciário.

Informações Adicionais

Legislação

Lei n. 14.133/2021 (Lei de Licitações), art. 40, § 3º, I

Lei Complementar n. 123/2006

Decreto n. 8.538/2015


 

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Processo

AgInt no REsp 1.773.335-SP, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 12/11/2025, DJEN 17/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

Tema

Ação popular. Condenação. Ressarcimento ao erário. Dano presumido. Impossibilidade.

Destaque

Não é possível a condenação, em ação popular, ao ressarcimento ao erário com base em dano presumido, sem comprovação efetiva de prejuízo financeiro e não apontado na petição inicial nexo causal e efetividade do dano para a responsabilização.

Informações do Inteiro Teor

A controvérsia discute a possibilidade de condenação em ação popular ao ressarcimento ao erário com base em dano presumido, sem comprovação efetiva de prejuízo financeiro.

No caso, foi ajuizada ação popular para anular prorrogação tácita de contratos firmados entre a São Paulo Transporte S.A. e empresas privadas, após o término de contratos emergenciais. Na sentença, foi julgado extinto o processo, por carência dos pressupostos da ação, qual seja, a comprovação dos fatos alegados e a suficiente descrição dos fatos e fundamentos jurídicos imputados aos réus. O Tribunal origem reformou a sentença e deu parcial provimento ao recurso de apelação para “declarar a nulidade dos contratos verbais realizados”, bem como determinou o ressarcimento ao erário, considerando ter havido dano presumido, cuja aferição viria em liquidação.

A Lei n. 14.230/2021 reformulou substancialmente a Lei de Improbidade Administrativa (Lei n. 8.429/1992), o que representou um marco no aprimoramento do Direito Administrativo Sancionador Estatal, especialmente no que tange à exigência de objetividade, proporcionalidade e segurança jurídica na imputação de responsabilidade aos agentes públicos e terceiros.

A nova lei consagrou um modelo sancionador fundado em garantias típicas do Direito Penal, consolidando o entendimento de que, em matéria punitiva, não se admite presunção de dano nem responsabilidade objetiva, sendo imprescindível a demonstração concreta de prejuízo ao erário para que se configure o ato de natureza lesiva.

Não se desconhece que a jurisprudência admitia, em certas situações, a presunção de dano ao erário, especialmente em situações de dispensa ou inexigibilidade de licitação tidas por irregulares, sob o fundamento da ausência de procedimento competitivo implicaria, por si só, dano presumido. Contudo, observo que o legislador rompeu expressamente com essa lógica, ao exigir dolo específico, nexo causal e dano efetivo e mensurável para a caracterização do ilícito administrativo sancionador.

Consiste em clara evolução sistemática: a norma passa a distinguir a mera irregularidade administrativa, que pode ensejar responsabilidade civil ou disciplinar, do ato ímprobo propriamente dito, cuja sanção pressupõe lesividade concreta ao patrimônio público. Assim, o prejuízo não pode ser presumido ou inferido de modo genérico; deve estar quantificado, individualizado e diretamente vinculado à conduta imputada, sob pena de violação aos princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e da tipicidade.

Nesse contexto, a lógica introduzida pela Lei n. 14.230/2021 irradia efeitos para todas as manifestações do Direito Sancionador Estatal, abrangendo não apenas a improbidade administrativa, mas também outras ações de natureza punitiva, como a ação popular, quando dela decorre pedido de condenação com efeitos sancionatórios, especialmente de natureza patrimonial. A norma introduz uma nova perspectiva do microssistema administrativo sancionador como um todo: deve haver dano concreto.

Assim, ainda que a ação popular possua natureza própria, voltada à anulação de atos administrativos lesivos ao patrimônio público, à moralidade administrativa e ao meio ambiente, quando o pedido veicula pretensão de condenação e devolução de valores ao erário, assume conteúdo de índole sancionatória, exigindo o mesmo rigor probatório imposto pela legislação mais recente em matéria de improbidade. Os subconjuntos normativos intercomunicam-se para formar um todo e, nesse caso, a pedra de toque é a aferição que, então, deve ser em função do prejuízo.

Dessa forma, a petição inicial em ação popular que busque a recomposição de danos deve conter a indicação clara e objetiva do prejuízo financeiro efetivo, com demonstração de onde, como e quanto o erário foi lesado, bem como quem teria sido beneficiado indevidamente.

O fato do ato impugnado ter sido irregular ou do procedimento administrativo ter seguido forma diversa da ideal, por si só, não basta para ensejar condenação pecuniária, uma vez que, a presunção de dano é incompatível com o Estado de Direito contemporâneo, que exige certeza, materialidade e dolo específico para a aplicação de qualquer sanção.

Portanto, a evolução legislativa consubstanciada na Lei n. 14.230/2021 reflete uma coerência lógica e principiológica do ordenamento jurídico, ao afastar o modelo anterior de punição fundada em presunções e ao aproximar o Direito Administrativo Sancionador dos postulados garantistas do Direito Penal. Essa aproximação traduz o reconhecimento de que a atuação punitiva do Estado, ainda que no âmbito administrativo, deve observar as mesmas limitações que regem o jus puniendi penal, resguardando direitos fundamentais e prevenindo arbitrariedades.

Ressalte-se que, aplicar entendimento diverso em ações populares equivaleria a admitir um duplo padrão jurídico para situações de mesma natureza material, violando o princípio da isonomia e o devido processo legal substancial.

Dessa maneira, no caso em comento, observa-se que, além de o autor não ter apontado, na petição inicial, a efetiva lesividade do ato impugnado, carecendo a ação, portanto, de pressuposto de admissibilidade, também não restou demonstrada, no curso da ação, qualquer perda patrimonial efetiva ao erário municipal.

Informações Adicionais

Legislação

Lei n. 8.429/1992

Lei n. 14.230/2021


Saiba mais:

 

TERCEIRA TURMA

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Processo

REsp 2.230.995-GO, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/11/2025, DJEN 26/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO CONSTITUCIONAL

Tema

Ação indenizatória. Reportagem jornalística. Finalidade informativa. Excesso. Violação dos direitos da personalidade. Ilicitude da conduta. Possibilidade de ressarcimento dos danos.

Destaque

Verificado o excesso de reportagem decorrente do desbordo dos fins informativos, devem prevalecer os direitos da personalidade com o consequente ressarcimento dos danos correlatos.

Informações do Inteiro Teor

O propósito recursal consiste em decidir acerca do cabimento de indenização por danos morais em decorrência de reportagem ilustrada com vídeo do recorrente e com afirmações categóricas a respeito de comportamento criminoso não comprovado.

Na origem, o recorrente ajuizou ação indenizatória contra emissora de televisão em razão de reportagem, veiculada em meados de 2021 e mantida nos canais de informação até os dias atuais, por meio da qual lhe foi imputada a autoria por agressões a enfermeiras que se manifestavam em solidariedade aos médicos vítimas da Covid-19, na Praça dos Três Poderes, em Brasília-DF.

Na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se a orientação no sentido de que “a liberdade de expressão, compreendendo a informação, opinião e crítica jornalística, por não ser absoluta, encontra algumas limitações ao seu exercício, compatíveis com o regime democrático, quais sejam: (I) o compromisso ético com a informação verossímil; (II) a preservação dos chamados direitos da personalidade, entre os quais incluem-se os direitos à honra, à imagem, à privacidade e à intimidade; e (III) a vedação de veiculação de crítica jornalística com intuito de difamar, injuriar ou caluniar a pessoa (animus injuriandi vel diffamandi)” (REsp 801.109-DF, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe 12/3/2013).

Assim, sempre que identificada, na hipótese em concreto, a agressão injusta à dignidade da pessoa, haverá a configuração do ato ilícito indenizável, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil. Isso porque “no desempenho da nobre função jornalística, o veículo de comunicação não pode descuidar de seu compromisso ético com a veracidade dos fatos narrados e, menos ainda, assumir postura injuriosa ou difamatória com o simples propósito de macular a honra de terceiros”, sendo que “[d]eixa de constituir exercício regular do dever/direito de informar, passando a configurar típico ato ilícito indenizável, todo o excesso de linguagem praticado por jornalista que, no afã de criar verdadeiro espetáculo sensacionalista, transmita ao público-alvo da suposta reportagem um juízo de prévia e açodada condenação e o estímulo, ainda que de forma indireta, à prática de atos hostis contra aquele que, protegido pela garantia constitucional do princípio da inocência, ainda deve ser tratado como mero investigado” (REsp 1.926.012-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe 15/3/2022).

A verossimilhança, elemento mínimo necessário para afastar a ilicitude do comportamento jornalístico, se traduz por meio da “aparência de algo verdadeiro”, “em que há condições de ter ocorrido realmente”. Dessa forma, não basta a existência de conjecturas ou palpites, sendo necessária a presença de uma possibilidade efetiva de ocorrência do que foi afirmado. A verificação da verossimilhança, portanto, revela o comprometimento dos meios de comunicação com o dever de informar responsavelmente.

Outrossim, a forma como a informação é veiculada pode influenciar e impactar – negativa ou positivamente – a imagem de determinado indivíduo perante a sociedade, de modo que as palavras também devem ser escolhidas sabiamente pelo jornalista, perito na comunicação, evitando-se afirmações taxativas quando não houver certeza do que se fala. A atenção à forma de transmissão da informação deve ser redobrada em períodos de instabilidade institucional, como foi o atroz episódio da Pandemia da Covid-19, bem como em períodos naturalmente sensíveis, como ocorre nas épocas de eleição.

No caso, têm-se que a conduta da emissora não está amparada pelo legítimo exercício da profissão. Isto é, ao publicar reportagem na qual constava vídeo com a imagem do recorrente e no qual afirmava, de modo taxativo, que ele seria “um terceiro agressor” a emissora não observou: (i) o dever de cuidado, pois não projetou as possíveis consequências identificáveis desta divulgação, notadamente em período no qual os ânimos sociais encontravam-se exaltados em razão da crise na saúde mundial em razão da Pandemia; e tampouco (ii) o dever de veracidade, tendo em vista que a reportagem não se limitou a informar a ocorrência e a investigação dos fatos, mas, ao contrário, fez conjecturas pejorativas a respeito da conduta do recorrente em rede nacional.

Destarte, ultrapassada a finalidade informativa da reportagem, e configurada a ofensa aos direitos da personalidade do recorrente, é cabível a condenação da empresa ao pagamento de indenização por danos morais ao recorrente e (b) à retirada da publicação.

Por fim, ressalta-se a inaplicabilidade do recente Tema 995/STF (RE 1.075.412), o qual cinge-se à responsabilidade subjetiva da empresa jornalística na hipótese de publicação de entrevista.

Informações Adicionais

Legislação

Código Civil, arts. 186 e 927.

Precedentes Qualificados

Tema 995/STF



Saiba mais:

 

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Processo

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025, DJEN 7/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Ação de reconhecimento de união estável homoafetiva post mortem. Requisitos para a configuração de união estável homoafetiva. Art. 1.723 do CC. Publicidade. Relativização. Possibilidade.

Destaque

É possível a relativização do requisito da publicidade para a configuração de união estável homoafetiva, desde que presentes os demais requisitos caracterizadores da união estável previstos no art. 1.723 do CC.

Informações do Inteiro Teor

A união estável é reconhecida como entidade familiar, merecendo proteção do Estado, consoante art. 226, § 3º, da CF. Trata-se de ato-fato jurídico, uma vez que não exige declaração de vontade ou contrato formal para sua constituição. Para que produza efeitos, basta a presença dos elementos caracterizadores previstos pela legislação civil.

Da interpretação atualizada do art. 1.723 do CC extraem-se os seguintes requisitos para o configuração de união estável: que a convivência entre duas pessoas seja pública, contínua e duradoura, com a intenção de constituir família. Diz-se atualizada, pois, em maio de 2011, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, de forma unânime, julgou conjuntamente a ADI 4277 e ADPF 132, para reconhecer a união pública, contínua e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

O requisito principal para a caracterização da união estável, sem dúvidas, diz respeito ao intuito de constituir família. É, pois, a intenção de viver como se casados fossem que distingue a união estável de relacionamentos como um namoro ou um noivado. Ainda que se esteja diante de um relacionamento público, contínuo e duradouro, se não constatada a intenção de constituição de família, a comunhão plena de vida e o tratamento recíproco como de casados, a relação não se caracterizará como entidade familiar.

Assim, é possível que uniões estáveis sejam constituídas mesmo que eventualmente relativizados alguns de seus requisitos, como pode ocorrer com a publicidade. A constituição da união estável depende muito mais da presença do ânimo de constituir família do que do conhecimento da relação pela sociedade em geral.

De fato, o requisito da publicidade não deve ser exigido como excessiva e desmedida exposição social, uma vez que não são os conviventes obrigados a propagar seu relacionamento e expor sua vida à público, sendo-lhes resguardada a proteção constitucional à privacidade (art. 5º, XII, da CF).

Na hipótese de união estável homoafetiva, o requisito da publicidade por vezes é difícil de se identificar, tendo em vista que a publicidade dessas uniões frequentemente se dá em recônditos mais estritos. Não é incomum que tais relações sejam omitidas de familiares, por receio de julgamentos ou represálias.

Na eventualidade de reconhecimento de união estável post mortem, a presença dos requisitos configuradores pode ser ainda mais complexa, pois os familiares chamados a depor podem não ter conhecimento da união, dificultando o reconhecimento da relação em razão da ausência de publicidade.

Diante desse cenário, cabe ao julgador apreciar ações de reconhecimento de união estável homoafetiva recorrendo à perspectiva histórico-cultural do meio em que viveu o casal, convalidando a publicidade da relação afetiva no meio social de convivência restrita à época. Os rigores da comprovação do requisito da publicidade em uniões estáveis homoafetivas devem ser mitigados conforme as peculiaridades da situação em concreto, ante o sigilo imposto pelos conviventes, inconscientemente ou não, muitas vezes como forma de sobrevivência e manutenção da integridade física, moral e psicológica na sociedade ao tempo de seu relacionamento.

Adotar o critério da publicidade de forma absoluta para a configuração de união estável homoafetiva é criar barreira indevida ao reconhecimento de uniões por muitos anos invisibilizadas pelo Estado e negar o direito fundamental à privacidade, por vezes indispensável para a sua segurança. Devem ser sopesados, pois, o requisito da convivência pública com o direito fundamental à privacidade de casais homoafetivos constantemente estigmatizados pela sociedade.

Dessa forma, a depender da situação em julgamento, é possível a relativização do requisito da publicidade para a configuração de união estável homoafetiva, desde que presentes os demais requisitos caracterizadores da união estável previstos no art. 1.723 do CC.

Informações Adicionais

Legislação

Código Civil (CC), art. 1.723

Constituição Federal (CF), art. 226, §3º


 

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Processo

REsp 2.207.934-RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 11/11/2025, DJEN 28/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL

Tema

Ação de responsabilidade. Administradores. Sociedade anônima. Corrupção corporativa. Simulação. Ocorrência. Ata da assembleia que aprovou as contas prestadas pelos administradores. Prévia anulação. Necessidade. Condição de procedibilidade.

Destaque

Nos casos de ação de responsabilidade de administradores fundada em alegada prática de atos de corrupção corporativa, a prévia anulação das atas assembleares nas quais houve a aprovação das contas por eles apresentadas constitui condição de procedibilidade.

Informações do Inteiro Teor

A prévia anulação judicial da aprovação das contas prestadas pelo administrador como condição de procedibilidade para a propositura da ação social de responsabilidade civil contra os administradores decorre da interpretação sistemática tanto do art. 159 como dos arts. 134, § 3º, e 286 da Lei n. 6.404/1976.

A reiterada posição da jurisprudência, no sentido de que a aprovação das contas do administrador pela assembleia de acionistas os exonera de eventuais responsabilidades e, por consequência, a propositura de ação social fica condicionada à prévia anulação da decisão de aprovação das contas, decorre da interpretação sistemática dos arts. 134, § 3º, e 286 da Lei n. 6.404/1976 quanto aos efeitos do denominado “quitus” para o direito societário brasileiro.

Trata-se o “quitus” de uma declaração unilateral e não receptícia de vontade por meio da qual os sócios manifestam sua concordância com as atividades empreendidas pelos administradores da sociedade, com consequências jurídicas que vão depender da lei respectiva, destacando-se uma clara tendência das legislações estrangeiras em limitar os seus efeitos.

No caso brasileiro, no entanto, quando aprovadas as demonstrações financeiras e as contas sem reservas, a consequência jurídica é a exoneração de responsabilidade dos administradores e fiscais, ressalvadas as hipóteses de erro, dolo, fraude ou simulação, as quais permitirão a anulação da deliberação assemblear, no prazo de dois anos – conforme disposto nos já mencionados arts. 134, § 3º, e 286 da Lei n. 6.404/1976 e, na sequência, a propositura da ação de responsabilidade.

Portanto, a prévia anulação da deliberação assemblear que concedeu o “quitus” condiciona a propositura da ação de responsabilidade civil contra os administradores, e a interpretação dos arts. 134, § 3º, 159 e 286 da Lei n. 6.404/1976 não permite outra conclusão, exatamente porque a exoneração ex lege, ou seja, os efeitos legais decorrentes do “quitus”, tal como expressamente previsto no citado § 3º do art. 134, perderiam completamente sua razão de existir, caso não impedissem a propositura da ação social de responsabilidade civil contra os administradores sem sua prévia anulação.

Em síntese, não há justificativa para alterar a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça acerca da necessidade de prévia anulação da deliberação assemblear, resultado da interpretação sistemática da Lei n. 6.404/1976, que confere ao “quitus” eficácia liberatória ampla, e que continua a ser a regra no direito societário brasileiro, conforme doutrina e jurisprudência prevalentes, não obstante algumas críticas e a tendência encontrada no direito estrangeiro.

O risco de alterar a jurisprudência acerca do tema, o que, na prática e pela via transversa, eliminaria o efeito liberatório do “quitus”, à revelia da expressa disposição constante do art. 134, § 3º, da Lei n. 6.404/1976, gerando insegurança jurídica e imprevisibilidade que a lei societária buscou exatamente evitar.

Ademais, restringir o efeito liberatório do “quitus” exclusivamente aos atos regulares de gestão seria esvaziar completamente o sentido do art. 134, § 3º, porque, para esses, como se sabe, o art. 158, caput, da Lei n. 6.404/1976 já exonera o administrador da responsabilidade pessoal.

No caso, a prática de atos simulados supostamente praticados pelos administradores, amolda-se à hipótese normativa descrita na parte final do art. 134, § 3º, da Lei n. 6.404/1976 e, portanto, recomenda a prévia anulação das deliberações assembleares que aprovaram as contas.

Informações Adicionais

Legislação

Lei n. 6.404/1976, art. 134, § 3º, art. 158, caput, art. 159 e art. 286



 

QUARTA TURMA

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Processo

REsp 2.081.015-SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 24/11/2025, DJEN 3/12/2025.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Prescrição. Prescrição intercorrente atinge apenas a pretensão (o direito de ação). Levantamento de depósito judicial. Impossibilidade de devolução. Art. 882 do CC/2002.

Destaque

Mesmo diante do reconhecimento da prescrição intercorrente, o pagamento de obrigação judicialmente inexigível não confere direito à repetição do indébito.

Informações do Inteiro Teor

A questão em discussão consiste em saber se, após o reconhecimento da prescrição intercorrente, é possível determinar a devolução de valores levantados pelo exequente em decorrência de depósito judicial.

A prescrição intercorrente atinge apenas a pretensão (o direito de ação), mas não elimina a obrigação subjacente, que se converte em obrigação natural, conforme entendimento consolidado no art. 882 do Código Civil.

Nesse sentido, o Tribunal de origem consignou que “o reconhecimento da prescrição da ação originária não impede a cobrança da dívida, ou seu pagamento, por outros meios”.

Sendo assim, o levantamento autorizado judicialmente configura pagamento válido de obrigação natural, mesmo em cenário de prescrição intercorrente, sendo vedada a repetição do indébito, sob pena de violação ao art. 882 do Código Civil.

Nesse sentido, já decidiu a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça que mesmo diante do reconhecimento da prescrição intercorrente, o pagamento de obrigação judicialmente inexigível não confere direito à repetição do indébito (devolução), em aplicação direta do art. 882 do Código Civil (AgInt no REsp n. 1.705.750/RS, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, julgado em 14/5/2025, DJEN de 19/5/2025).

Informações Adicionais

Legislação

Código Civil, art. 882.


 

QUINTA TURMA

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Processo

AgRg no REsp 2.098.118-MG, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 29/10/2025, DJEN 4/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PENAL

Tema

Roubo impróprio. Violência posterior à subtração. Configuração.

Destaque

A expressão “logo depois” utilizada no art. 157, § 1º, do Código Penal, no crime de roubo impróprio, não exige que a violência ocorra imediatamente após a subtração, admitindo-se algum lapso temporal entre os eventos.

Informações do Inteiro Teor

A controvérsia consiste em saber se a violência empregada após a subtração da coisa, com o objetivo de evitar a captura do agente, caracteriza o crime de roubo impróprio, nos termos do art. 157, § 1º, do Código Penal.

O Tribunal de origem desclassificou a conduta para os delitos de furto (art. 155 do Código Penal) e lesão corporal (art. 129 do Código Penal), fixando penas menores.

No entanto, o panorama fático estabelecido pelo Corte a quo assentou que: a) o réu furtou a motocicleta da vítima; b) o ofendido presenciou o fato e saiu no encalço do réu; c) posteriormente, encontrou o réu e o deteve para impedir a fuga; d) o réu então se utilizou de violência contra a vítima, desferindo-lhe um golpe na cabeça, para evitar a sua captura.

Nesse contexto, verifica-se que o tipo penal mais adequado ao fato é aquele previsto no art. 157, § 1º, do Código Penal. O dispositivo em questão expressamente prevê a possibilidade de que a violência seja empregada logo depois de subtraída a coisa, com o fim de assegurar a impunidade do crime.

No caso, houve violência, bem como a finalidade de assegurar a impunidade, com a tentativa de se evitar a captura do autor do fato. A expressão “logo depois” utilizada no art. 157, § 1º, do Código Penal não exige que a violência ocorra imediatamente após a subtração, admitindo-se algum lapso temporal entre os eventos, desde que vise garantir a posse do bem ou a impunidade do delito.

Ademais, o texto do tipo penal utiliza-se da mesma expressão prevista no art. 302, inciso IV, do Código de Processo Penal, que trata do “flagrante presumido”, o qual pressupõe algum lapso temporal entre o fato e a captura do autor com elementos do crime.

Informações Adicionais

Legislação

Código Penal (CP), art. 129, art. 155 e art. 157, §1º

Código de Processo Penal (CPP), art. 302, inciso IV


 

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Processo

AgRg no HC 1.017.622-SC, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 19/11/2025, DJEN 26/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PENAL

Tema

Cultivo doméstico de cannabis sativa. Finalidade medicinal. Necessidade terapêutica comprovada. Pendência de regulamentação específica. Salvo-conduto. Possibilidade.

Destaque

É possível a concessão de salvo-conduto para o cultivo de cannabis sativa para fins medicinais, desde que comprovada a necessidade terapêutica por documentação idônea, até que haja regulamentação específica pelo Poder Executivo Federal.

Informações do Inteiro Teor

A controvérsia consiste em saber se é cabível a concessão de salvo-conduto para o cultivo doméstico de cannabis sativa para fins medicinais, por meio de habeas corpus, diante da ausência de regulamentação específica pela ANVISA e pelo Ministério da Saúde.

Sobre o tema, a Terceira Seção desta Corte uniformizou o entendimento sobre a possibilidade de se admitir a concessão de salvo-conduto para importação de sementes e cultivo de Cannabis Sativa para fins terapêuticos para aquelas pessoas que evidenciem, por documentação idônea (e.g. laudos médicos, receitas médicas, autorizações de importação de medicamentos derivados de Canabidiol emitidas pela ANVISA, entre outros), a necessidade de administração do referido medicamento para o tratamento de suas enfermidades, até que a questão seja regulamentada pelo Poder Executivo Federal, conforme o art. 2º, parágrafo único, da Lei n. 11.343/2006.

Nesse julgamento, o pedido foi acolhido “a fim de conceder salvo-conduto, para autorizar o paciente a cultivar a Cannabis sativa no local em que reside, exclusivamente para fins medicinais e para uso próprio, e determinar que as autoridades coatoras do sistema penal se abstenham de atentar contra a liberdade de locomoção do paciente, ficando impedidas de apreender as plantas utilizadas para o tratamento medicinal, garantindo o exercício regular do direito à saúde, ante a prescrição médica e autorização legal do Ministério da Saúde e da ANVISA para utilizar os princípios ativos existentes no extrato de Cannabis Sativa.” (EDcl no AgRg no RHC 165.266-CE, Ministro Jesuíno Rissato – Desembargador convocado do TJDFT, Terceira Seção, DJe de 3/10/2023).

Ademais, correta a decisão que reconheceu a indevida negativa na prestação jurisdicional pelo Tribunal estadual e determinou a apreciação do habeas corpus deduzido na origem, uma vez que o sobrestamento do writ originário, em razão de incidente de assunção de competência instaurado na Corte a quo é manifestamente ilegal, visto que o próprio art. 980 do Código de Processo Civil, ao dispor sobre sobre o incidente de resolução de demandas repetitivas, excepcionou o habeas corpus.

Informações Adicionais

Legislação

Lei n. 11.343/06, art. 2º, parágrafo único.

Código de Processo Civil (CPC), art. 980


Saiba mais:

 

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Processo

EDcl no AREsp 2.802.065-PR, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 11/11/2025, DJEN 19/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Tribunal do Júri. Materialidade e autoria reconhecidas. Absolvição pelo quesito genérico. Ausência de tese defensiva. Decisão manifestamente contrária à prova dos autos.

Destaque

A ausência de tese defensiva registrada em ata que justifique a absolvição por clemência ou outra causa correlata, aliada à contradição entre as respostas dos jurados, autoriza a anulação do julgamento e a realização de novo júri.

Informações do Inteiro Teor

A questão consiste em saber se há contradição entre as respostas dos jurados que, ao reconhecerem a materialidade e autoria do crime de homicídio qualificado, absolvem o acusado no quesito genérico, sem que houvesse tese defensiva diversa da negativa de autoria ou desclassificação, nem pedido de clemência.

Com o advento da Lei n. 11.689/2008, a sistemática de quesitação no Tribunal do Júri sofreu significativa alteração, com vistas a facilitar o julgamento e reduzir as chances de ocorrerem nulidades. A principal alteração promovida diz respeito ao quesito trazido no art. 483, inciso III, do Código de Processo Penal, sendo imprescindível questionar aos jurados “se o acusado deve ser absolvido”, ainda que a resposta aos quesitos anteriores, relativos à materialidade e à autoria, tenha sido afirmativa.

Sobre o tema, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o HC 23.409/RJ, em julgamento realizado em 28/2/2018, firmou entendimento no sentido de que a decisão de clemência será passível de revisão pelo Tribunal de origem quando não houver respaldo fático mínimo nos autos que dê suporte à benesse.

No caso, o Tribunal de origem entendeu não haver contradição entre as respostas positivas dos jurados quanto à materialidade e à autoria delitivas e a conclusão pela absolvição, embora as teses defensivas registradas em ata se limitassem à negativa de autoria e à desclassificação (para lesão corporal seguida de morte, para homicídio privilegiado ou para homicídio simples).

Contudo, tal entendimento encontra-se em dissonância com a jurisprudência do STJ, pois se as teses da defesa se limitaram à negativa de autoria e à desclassificação da conduta, a absolvição reconhecida pelos jurados, no terceiro quesito (obrigatório) conflita com a resposta afirmativa dos leigos para os dois primeiros quesitos (EDcl no AgRg no HC 695.442/SP, Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 12/11/2021).

Nesse sentido, forçoso reconhecer-se que “[s]e a valoração dos elementos probatórios pelo Conselho de Sentença aponta ser o agravante o autor do delito, torna-se manifestamente contrária a esta mesma prova a sua absolvição, se não há qualquer argumento defensivo outro que não a negativa de autoria” (AgRg no AREsp 667.441/AP, Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe de 22/4/2019).

Dessa forma, caso não se verifique a existência de tese defensiva diversa da negativa de autoria ou da desclassificação, tampouco pedido de clemência, há evidente contradição nas respostas dos jurados que, embora respondam afirmativamente aos dois primeiros quesitos – reconhecendo a materialidade e a autoria -, decidam por absolver o acusado no terceiro quesito.

Informações Adicionais

Legislação

Código de Processo Penal (CPP), art. 483, inciso III

Lei n. 11.689/2008


 

SEXTA TURMA

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Processo

HC 1.035.054-SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 18/11/2025, DJEN 27/11/2025.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Apreensão de celular. Relatório de investigação. Imagens de tela de aplicativo de mensagem obtidas ilicitamente. Posterior extração de dados com autorização judicial. Fonte independente. Prova lícita.

Destaque

Apesar da ilicitude do conteúdo do relatório de investigação com imagens de captura de tela (prints ou screenshots) de conversas de WhatsApp, a posterior extração dos dados do aparelho celular da paciente realizada com autorização judicial permite classificar tais provas como de fonte independente, nos termos do art. 157, § 2º, do Código de Processo Penal.

Informações do Inteiro Teor

Cinge-se a controvérsia a determinar se ilegalidade no relatório de investigação referente a imagens de captura de mensagens no aparelho de telefone celular da ré contamina a posterior extração desses dados com autorização judicial.

O aparelho celular da paciente foi apreendido de forma legítima, por ocasião de sua prisão em flagrante. Após o oferecimento da denúncia, a autoridade policial apresentou relatório de investigação instruído com imagens de captura de tela com mensagens de WhatsApp encontradas no telefone celular da acusada.

Essa prova fora obtida em contrariedade à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os dados armazenados em aparelho celular apreendido apenas podem ser acessados validamente com o consentimento do titular ou autorização judicial (AgRg no HC 912.604/TO, Ministro Joel Ilan Paciornik, DJEN de 8/4/2025).

Constatada a ilegalidade do conteúdo do relatório de investigação, o Ministério Público requereu ao Juízo que a prova fosse desentranhada dos autos e, na mesma promoção, pediu o levantamento do sigilo dos dados armazenados nos dispositivos apreendidos na ocorrência, o que foi deferido.

Apresentados os fatos, constata-se que inexiste ilegalidade a ser reconhecida, porque a condenação da paciente foi suficientemente fundamentada em outras provas que não as mensagens posteriormente obtidas com autorização judicial, nomeadamente aquelas arrecadadas quando de sua prisão em flagrante (AgRg no HC 971.888/SP, Ministro Carlos Cini Marchionatti – Desembargador convocado do TJRS, Quinta Turma, DJEN de 9/6/2025).

Além disso, a posterior extração dos dados do aparelho celular da paciente com autorização judicial permite classificá-los como prova de fonte independente, nos termos do art. 157, § 2º, do Código de Processo Penal.

Segundo o entendimento desta Corte Superior, para que se reconheça que a prova tida como ilícita poderia ter sido igualmente obtida pelos trâmites típicos da investigação criminal – e, portanto, por fonte independente -, é preciso que a acusação demonstre, com clareza e amparo concreto em elementos dos autos, no mínimo, a alta probabilidade de que os eventos fatalmente se sucederiam de forma a atingir o mesmo resultado alcançado de maneira ilícita (HC 695.895/MS, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 16/11/2022).

No caso, o dispositivo em questão havia sido legalmente apreendido por ocasião da prisão em flagrante, de maneira que seria absolutamente natural que o Ministério Público ou a autoridade policial, em algum momento, postulassem ao Juízo o afastamento do sigilo dos dados armazenados no dispositivo; logo, não há dúvida de que as conversas de WhatsApp obtidas após a autorização judicial para acesso aos dados armazenados no telefone celular da paciente são provas obtidas por fonte independente.

Informações Adicionais

Legislação

Código de Processo Penal (CPP), art. 157, § 2º.